- Resumo de Direito Processual Penal:
1. Prisão em flagrante (art. 302, CPP): É um procedimento administrativo.
1.1. Surpreendido na prática do delito;
1.2. Encontrado com elementos ilícitos;
1.3. Impróprio;
1.4. Presumido;
1.5. Próprio;
1.6. Captura: Reter o suspeito e leva-lo.
1.7. Voz de prisão: Ordem da prisão em flagrante.
1.8. Lavratura do auto: Prender e entregar nota de culpa na presença das testemunhas instrumentais.
2. Tipos de flagrante;
2.1. Esperado (Lícito): Surpreender o criminoso no ato.
2.2. Preparado (Ilícito): Provoca-se elementos de prova e não há legitimação judicial (Sum 145, STF). Não permitido pois há interferência na vontade (ex: Sabendo-se que um criminoso vai roubar, não se deve deixar elementos de seu interesse expostos).
2.3. Diferido (Ação controlada): Meio de prova pelo qual se alcança o flagrante, dependendo de ação judicial (Lei 12850/13) com flagrante retardado, não havendo prevaricação por parte da autoridade que controla a ação.
2.4. Forjado (Ilegal): Inserção de provas em local de crime ,
2.5. Diplomatas: Não podem ser presos em flagrante pois têm imunidade processual. Pode-se retê-lo pois isto não é prisão em flagrante, esta se dá com a lavratura do auto de culpa.
3. Direito a informação:
3.1. APF (APFD): Contenção. Qualquer pessoa pode conter outra que esteja praticando crime até que cheguem as autoridades.
3.2. Condutores (Art. 304): PM ou populares.
3.3. Audiência de custódia: Pessoas além do acusado serão dispensadas em uma audiência de 24 horas.
3.4. Termo circunstanciado de ocorrência: Registro de um fato tipificado como infração de menor potencial ofensivo, ou seja, os crimes de menor relevância, que tenham a pena máxima cominada em até 02 (dois) anos de cerceamento de liberdade ou multa. O referido registro deve conter a qualificação dos envolvidos e o relato do fato, ou seja, nada mais é do que um boletim de ocorrência, com algumas informações adicionais, servindo de peça informativa, para o Juizado Especial Criminal.
4. Apreensão de bens, dinheiro o outros materiais:
5. Audiência de custódia (Pacto de SJCR/92): Não há previsão legal no CPP.
6. Relaxamento: Para flagrantes ilegais.
6.1. Concessão de liberdade provisória e medida cautelar: Após homologação em flagrante (se for legal), mas pode ser substituído por medidas cautelares.
7. Conversão em preventiva (Art. 312 e 313): Requisitos.
7.1. Ordem pública, econômica, aplicação da lei penal (art. 312).
7.2. Crimes, reincidência, certidão de antecedentes criminais e descumprimento da medida protetiva (art. 313).
8. Aplicação da lei penal: Risco de fuga.
9. Conveniência da instrução criminal: Risco de suborno.
10. Ordem pública X Ordem econômica:
10.1. Pública: Ligada ao exercício da soberania estatal. Risco a ordem social com a prática de crimes. Gravidade concreta do crime, clamor público, medidas cautelares alternativas anteriores à prisão (art. 317, CPP).
11. Prisão preventiva: Não pode ser pedida de ofício e deve ser sempre motivada.
12. Audiência de custódia: A audiência de custódia, visa coibir os abusos ocorrido no momento da prisão do acusado. Em muitos casos, os policiais, no intuito de sacramentarem a prisão em flagrante de um indivíduo, que até cometeu um crime, mas que naquele instante não se apresentavam os motivos para que ele fosse conduzido à presença da autoridade, para a lavratura do flagrante.
13. Prisão domiciliar: Processual, provisória mais restrita.
14. Comprovação: Sempre necessária e exigida pelo juiz.
15. Diferenças entre DPC e DPP: No DC há composição de conflitos fora do judiciário, o DC existe independente do DPC. Já o DP não pode ser utilizado fora do DPP.
15.1. Ação penal: Leva ao judiciário a discussão sobre a existência do crime (autoria e materialidade).
16. Ação civil X Ação Penal:
16.1. Civil: Pode ser feita entre as partes no momento do conflito.
16.2. Penal: Só pode ser feita pelo judiciário pois o direito de punir só pertence a ele.
17. Estado Juiz: Somente o Estado tem direito de tirar a liberdade do individuo (pretensão punitiva é o direito de punir). Não age para garantir a segurança pública mas a aplicação da CF.
18. Função do processo penal: Materializar o direito de punir do Estado.
19. Processo penal: Instrumento de aplicação do direito material e das garantias constitucionais do processo. O processo é um garantia do sujeito acusado ou envolvido no sistema penal contra o Estado e não um instrumento de segurança pública.
20. Estado democrático de direito: Para que exista o poder do Estado deve ser limitado, garantia dada pela CF/88.
21. Provocação da justiça penal: Depois da ocorrência do crime, logo o Estado não garante a segurança pública. O agente de segurança pública é a policia e não o Judiciário.
22. Autoria e Materialidade:
22.1. Materialidade: Verifica se houve crime.
22.2. Autoria: Buscar quem é o autor do crime.
23. Liberdade do processo penal: O Direito de liberdade só pode ser infringido excepcionalmente.
24. Objeto do processo penal:
24.1. DPC: Litígio entre as partes e discussão de interesses. O autor pede algo seu contra o sujeito.
24.2. DPP: Não há lide como objeto.
25. Pretensão acusatória X Pretensão punitiva:
25.1. Acusatória: Pertence ao Estado particular, o acusador, que não tem direito de punir mas de veicular ao MP ou querelante através da petição.
25.2. Punitiva: Pertence ao Estado Juiz. Se esta sumir e o Estado perder esse direito, o acusador não poderá mais veicular sua ação.
26. Direito limitado de punir: Pertence ao Estado quando surge o crime. Se o acusador tentar tomar para si este direito, não haverá pretensão punitiva.
27. Acusação: Só se aplica a pretensão punitiva com acusação (princípio da inércia).
28. Elementos da pretensão acusatória:
28.1. Subjetivo: Acusação e defesa.
28.2. Objetivo: Caso ou fato penal. Descrição do crime, também conhecido como fato punível, para permitir a defesa do réu, feito através de petição.
28.3. Pedido: Condenação. Este não é fundamental para diferenciar as ações pois é sempre o mesmo.
29. Polo ativo X Polo passivo: Trarão a diferença no pedido.
29.1. Passivo: Vai ser a principal diferença pois varia bastante, este deve ser sempre individualizado antes da ação e não durante (ex: Réu).
29.2. Ativo: Na maioria das ações será o Estado (ex: MP e querelante).
30. Sistemas processuais: Inquisitório X acusatório.
30.1. Estado juiz: Terceiro desinteressado e imparcial.
30.2. Autor: Acusação;
30.3. Réu: Defesa.
31. Produção de provas: Só pode ser exercida pelas partes e nunca pelo juiz pois este é imparcial. O fato penal chega ao juiz através das alegações das partes.
31.1. Inquisitório: O juiz produz as provas.
31.2. Acusatório: O juiz não pode produzir provas (modelo mais compatível com a CF/88).
32. Características do sistema inquisitório:
32.1. O juiz pode produzir provas: Confusão entre acusação e juiz.
32.2. Verdade absoluta: Encontrada pela confissão;
32.3. Produz processos secretos;
32.4. Provas tarifadas: Provas com valores diferentes;
32.5. Justifica qualquer meio de obtenção de provas.
32.6. Decisionismo judicial;
32.7. Relação processual linear: Direitos e deveres entre autor e réu;
32.8. O réu é objeto: Submisso a persecução penal;
32.9. Não há contraditório nem ampla defesa;
32.10. Julgador multifuncional: Acusa, julga e defende;
32.11. Verdade secreta: Não havia publicidade;
32.12. Procedimento descontinuado: Durava meses;
32.13. Marcado pela escritura: Autoridade delegada do inquisidor;
32.14. Confissão como prova fundamental;
33. Características do sistema acusatório:
33.1. Separação de funções;
33.2. Juiz natural desinteressado na causa;
33.3. Produção de provas pertence as partes;
33.4. Isonomia: Partes tratadas de forma igualitária;
33.5. Contraditório e ampla defesa;
33.6. Presunção de inocência do Réu;
33.7. Coisa julgada estabiliza as decisões;
33.8. Recurso: Para rediscutir as decisões (duplo grau de jurisdição);
33.9. Prisão provisória: Só quando o indivíduo representa ameaça ao processo;
33.10. Decisões públicas e fundamentadas;
33.11. Não se admitem provas produzidas ilicitamente;
33.12. Atividade probatória;
33.13. Verdade processual: No lugar da verdade real, é buscada a certeza do juiz.
34. Processo penal antes da idade média (Antiguidade clássica): Existia mas não tinha grande relevância para o estudo atual. O processo penal só tem sentido quando a questão penal torna-se responsabilidade do Estado.
35. Características da antiguidade clássica:
35.1. Julgamento popular;
35.2. Não há busca da verdade, mas do melhor convencimento;
35.3. Sistema de íntima convicção: Sem bases sólidas;
35.4. Processo acusatório puro;
36. Contribuição do modelo inquisitivo:
36.1. A questão penal passa a ser uma questão de Estado;
36.2. Oficialidade: A justiça penal torna-se exclusiva do Estado com o uso legítimo da força.
36.3. O processo penal passa a se ocupar da busca pela verdade material;
37. Modelo puro do processo penal: O sistema é o meio pelo qual o tipo penal se desenvolve em um país.
38. Processo acusatório na CF/88: A ação penal pública é privativa do MP, quem acusa não julga (princípio acusatório) -Art. 129, I-.
39. Provas:
39.1. Livre convencimento motivado: O juiz é livre para decidir;
39.2. Persuasão racional (Art. 209 CPP);
39.3. Gestão pertence as partes;
39.4. Toda prova não proibida vale;
40. Características do modelo acusatório: Puro e típico.
40.1. Cognicidade judicial: O juiz conhece o objeto;
40.2. Relação angular: O juiz como mediador imparcial (não neutro);
40.3. Distinção entre quem acusa, julga e defende;
40.4. Convencimento judicial;
40.5. Publicidade dos atos processuais: Oralidade e convencimento;
40.6. Contraditório e ampla defesa: O réu é sujeito de direitos do processo.
41. Oralidade:
41.1. Concentração;
41.2. Imediação;
41.3. Identidade física do juiz.
42. Verdade material (O juiz apenas baliza o direito): Conteúdo inquisitivo desenvolvido nas características de um processo acusatório.
43. Inquisitivo/Acusatório e Inquisitorial/Adversarial:
43.1. Inquisitivo/acusatório: Sistema brasileiro, o único compatível com o estado democrático de direito.
43.1.1. Não representa um retrocesso;
43.1.2. Modelo acusatório com iniciativa probatória do juiz no curso do processo;
43.1.3. É preciso que haja ação penal;
43.1.4. O juiz pode produzir conteúdo inquisitivo;
44. Sistema misto: Não há contrariedade de posicionamentos;
44.1. Investigação preliminar: Inquérito policial para apurar autoria e materialidade.
44.2. Justa causa: Depois de apurado o fato, ampara-se a ação penal.
45. Lide: Começa-se a discutir o conceito a partir de uma pretensão resistida. A função do processo é solucioná-la.
45.1. No processo penal, na maioria das vezes, o Estado é parte, representando a vítima.
45.2. Ação penal privada: Crime processado mediante queixa.
45.3. Ação penal pública: Crime processado mediante representação.
46. Sistema inquisitório X acusatório:
46.1. Investigação sumaríssima (breve);
46.2. Secularização do processo: Cisão entre Igreja e Estado.
46.3. Surgimento do inquérito;
47. Declaração do homem e do cidadão: Instituição de direitos e garantias individuais;
47.1. A pena não pode mais atingir o corpo do condenado;
47.2. Prazo e espaço adequados para cumprimentos das penas.
48. Sistema acusatório: Usado no Brasil.
48.1. Investigação criminal no sistema acusatório: Separação entre órgãos de investigação, acusação e julgamento.
48.2. Princípio da correlação entre acusação e sentença: O juiz não pode fazer sentenças extra petita (acusar alguém de algo que não está sendo investigado). Se houverem mais coisas a serem acrescentadas, será iniciada uma nova investigação.
48.3. Se o juiz tiver dúvidas sobre as provas produzidas: Poderá expedir ofícios diretamente para solucioná-las (art. 155, CPP).
48.4. Fases distintas de investigação e publicidade: Diligências que a autoridade deve realizar no inquérito (ex: pedir ou não o laudo pericial).
49. Livre convencimento motivado: Para condenar ou absolver.
49.1. O juiz pode fundamentar sua sentença com elementos do inquérito mas não exclusivamente produzidos por ele pois no inquérito policial não há compromisso com o contraditório.
49.2. Meios lícitos de produção de prova: Meios legais que observam um critério previsto em lei (ex: Prazo de interceptação telefônica).
50. Sistema misto: Fase inquisitorial e outra acusatória.
50.1. A fase inquisitorial é obrigatória;
50.2. Inquérito policial: Não é obrigatório no Brasil, por isso nosso sistema não é misto.
51. Princípios:
51.1. Utilidades:
51.1.1. Interpretação de normas existentes;
51.1.2. Organização e interpretação entre normas conflitantes;
51.1.3. Preencher lacunas;
51.2. Devido processo legal: Organiza a aplicação dos demais.
51.2.1. Princípio da legalidade: As regras precisam estar pré-definidas antes do processo e não podem mudar ao longo do processo.
51.3. Ampla defesa e contraditório:
51.3.1. Ampla defesa:
51.3.1.1. Auto defesa: Durante o processo, é necessário que a pessoa processada tenha pelo menos uma oportunidade de falar diretamente com o juiz (ex: interrogatório).
51.3.1.1. Defesa de Qualidade: Dar acesso a pessoa processada ao direito de uma defesa completa e eficaz para determinada questão.
51.2.2. Contraditório:
51.2.2.1. Informação: As partes devem ser informadas de todos os atos do processo por diversos meios (ex: Diário de justiça, intimação -pode ser por meio do advogado-). A informação deve ocorrer na fase do inquérito.
51.2.2.2. Reação: Direito de reagir a informação (ex: Recorrer interpondo recurso).
52. Duplo grau de jurisdição: Toda pessoa que é parte no processo tem direito de revisão dos atos judiciais. O órgão revisor deve ter mais magistrados que o anterior.
52.1. Não está na CF/88.
52.2. Prerrogativa de função: Não há duplo grau em ultima instância.
53. Quando não há contraditório (sv 14):
53.1. A procuração é de interesse específico do representado: O inquérito policial não é público.
53.2. Elementos de prova: O acesso é apenas aos elementos já documentados.
53.3. Segredo de justiça: O inquérito não tramita em segredo mas seu acesso é restrito as partes.
53.4. Inquérito volumoso: Restringe-se o acesso dos autos apenas ao que interessa às partes representadas.
54. Não culpabilidade e presunção de inocência: Garantias processuais relacionadas ao trânsito em julgado.
54.1. Culpabilidade presumida: Não pode ocorrer, nem todos que respondem a um processo criminal são necessariamente culpados.
54.2. Presunção de inocência: Princípio que protege o indivíduo do Estado que tem todos os mecanismos de investigação.
55. Glossário:
55.1. Representado: Investigado no inquérito;
55.2. Custodiado: Preso levado para a audiência de custódia;
55.3. Réu: Respondendo ação penal;
55.4. Condenado/Absolvido: Após a sentença;
55.5. Apelante/Apelado: Se há apelação;
55.6. Condenado/Apenado: Em qualquer fase da execução penal;
55.7. Egresso: Final da execução pelo prazo de 5 anos.
56. Princípios constitucionais:
56.1. Juiz natural: Devem haver regras objetivas de competência jurisdicional, garantindo a independência e imparcialidade do órgão julgador.
56.1.1. Identidade física: O juiz substituto assumirá todas as funções desempenhadas pelo anterior.
56.1.2. Ingresso no judiciário: Concurso de provas e títulos.
56.2. Sistema acusatório (princípio constitucional): O Estado detém o jus puniendi e é responsável pelo poder dever de punir.
56.2.1. Estado democrático de direito material: Fonte das garantias.
56.2.2. Princípio constitucional: Quando se torna base do sistema acusatório.
56.3. Justa causa (princípio constitucional): Relação com o princípio da fundamentação de decisões. Somente ele não é suficiente para fundamentação da causa, deve haver base empírica idônea.
56.3.1. Causa provável: Reunião dos indícios de autoria e materialidade.
56.3.2. Base empírica idônea: Provas.
56.3.2.1. Indícios de autoria e materialidade (ex: Provas do crime);
56.3.2.2. Produzidas por meios lícitos.
56.3.3. Análise de impacto criminológico: Não deve haver obrigatoriedade para o MP oferecer denúncia.
56.3.4. Obrigatoriedade da ação penal: Se o Estado define determinado conflito como importante, ele é obrigado a investigar. Se não encontrarem provas suficientes para punir, será obrigado a pedir absolvição.
56.4. Economia processual: Prática dos atos processuais da forma mais econômica possível. Com base no princípio do livre convencimento, o juiz pode deferir a produção de provas.
56.4.1. Possibilidade de acordo: Por este princípio, o Estado pode deixar de punir quando o crime for de baixo potencial ofensivo (Lei 2850/13).
56.4.2. Colaboração premiada: Não se processa criminalmente o indivíduo em troca de elementos importantes para a investigação.
56.4.3. A defesa deve indicar assistentes técnicos mais econômicos.
57. Princípios legais;
57.1. Publicidade: Todos os processos são públicos com exceção dos que tramitam em segredo de justiça. Os atos penais são publicados no diário de justiça ou no Oficial da União.
57.1.1. Segredo de justiça: Ocorre normalmente em ações penais públicas condicionadas a representação ou ações penais privadas pois os bens jurídicos tutelados são mais sensíveis (ex: Crimes contra a dignidade sexual).
57.2. Oficialidade: Dar caráter oficial ao processo.
57.2.1. Intimação pessoal do réu: Para que ele saiba oficialmente que está sendo processado.
57.2.2. Redução à termo: Qualquer pessoa que consultar o processo deve saber em que momento está.
57.2.3. Escrita: Não é necessário escrever todos os atos processuais. Os atos são gravados e o registro é juntado aos autos com as atas.
57.3. Celeridade: Realizar atos processuais da forma mais rápida possível, sem violar direitos e garantias.
57.3.1. Procedimento ordinário (proporcionalidade): Acusação e defesa podem arrolar 8 testemunhas para cada um dos fatos. Se o juiz estiver satisfeito com os depoimentos, para dar mais celeridade, poderá dispensar as demais testemunhas.
57.3.1.1. Testemunhas de fato: Presenciaram ou participaram indiretamente do ato criminoso.
57.3.1.2. Testemunhas de conduta: Arroladas para a comprovação de circunstâncias penais pois conhecem a personalidade do réu.
58. Aplicação da norma processual no tempo e no espaço: Princípios.
58.1. Verdade real: Reprodução do fato ocorrido e, à partir desta, chega-se a autoria e materialidade.
58.2. Verdade processual: Reproduzir fatos à partir das provas admissíveis (Ex: Laudos e provas testemunhais). Reconstrói-se a cena com as provas existentes para alcançar a única verdade permitida no processo penal.
59. Atos processuais: Atos oficiais praticados por aqueles investidos em determinados cargos.
59.1. Oficialidade: Imbuir o ato de oficialidade por meio da pessoa que o exerce pois os ritos nos tribunais são todos oficiais por meio da legitimidade. São oficiais pra que se entenda qual é sua sequência e se tenha controle.
59.2. Publicidade: São todos públicos.
59.3. Oficiosidade: Ligada a redução a termo, os atos são praticados por pessoas especificas (ex: Interrogatório, audiência de custódia, juri). Ocorre emprego de linguagem específica, termos adequados, teatralidade.
60. Territorialidade (Art. 1º):
60.1. Exceção: Previsões em tratados internacionais.
61. Crimes praticados por detentores de prerrogativa: O CPP só será usado quando houver omissão.
62. Crimes de competência da Justiça Militar será na Justiça Especial.
63. Crimes de imprensa: A lei de imprensa, segundo o STF, não deveria ter sido controlada pela CF/88 pois fere o princípio da liberdade de imprensa (ADI 3510).
64. Irretroatividade da norma processual penal: Aplica-se a norma processual penal à partir de sua data de publicação, aproveitando-se todos os atos processuais já realizados (o tempo rege o ato). Se determinado ato processual observou uma lei vigente na época e esta e esta muda no curso do processo, todos os atos anteriores são aproveitados. Ao contrário da norma material, a lei processual penal não retroage (só a lei penal retroage quando for favorável ao réu). A norma mais favorável só se aplica em questões materiais e não processuais.
65. Matéria penal e processual penal: Ordenamento.
65.1. CF;
65.2. CPP (Lei 12.258/10): Um decreto lei que não passou pela aprovação do legislativo. Alterado sucessivamente por meio de leis ordinárias.
65.3. Leis complementares: Estabelecem atribuições do MP (LC 75);
65.4. Medidas provisórias: A lei veda qualquer alteração processual por meio delas, por isso não entram no rol do DPP. Para legislar em matéria processual penal a competência é da União.
65.5. Resoluções: Atos normativos publicados por determinados órgãos. Atos legislativos que influenciam em matéria processual penal mas não têm necessariamente natureza cogente (coercitiva) -ex: Portarias-.
65.5.1. CNJ: Órgão de controle externo do Judiciário que cria resoluções importantes mas pouco cogentes para o PP (ex: Resolução 213 e 225).
65.6. Recomendações: Caráter de audiência (pouco cogente).
65.6.1. MP: Se suas recomendações não forem atendidas podem gerar ação civil pública.
65.7. Ativismo judicial: Se for em matéria penal, geram fatos institucionais mas não geram normas formais (ex: Justiça negocial).
66. Competência concorrente entre União e Estado: Matéria penitenciária.
66.1. Cada estado (Executivo estadual) é responsável pela organização de seu sistema penitenciário. Há leis estaduais que regulamentam questões do sistema penitenciário (ex: Visita íntima).
66.2. Legalidade e discricionariedade: O diretor penitenciário também pode decidir questões regulamentares.
66.3. Leis estaduais: Podem influenciar no processo penal desde que se refiram a natureza penitenciária.
67. Inquérito policial: Realiza a maioria das investigações preliminares.
67.1. Todos os procedimentos relacionados ao inquérito estão no CPP (segurança jurídica sobre o que a autoridade policial pode ou não fazer).
68. Fase de investigação preliminar: Não há juízo de culpabilidade.
69. Procedimento administrativo: O inquérito tem natureza administrativa, conduzido exclusivamente pela polícia judiciária, presidida pelo delegado (civil e federal) -art. 144 CF-. Não é obrigado a observar princípios e garantias constitucionais.
69.1. Exceções: PM (evita a prática dos crimes de forma preventiva e ostenciva) e PRF.
70. Sequência dos atos de inquérito:
70.1. Notícia de crime: Registro em B.O (Natureza pública incondicionada com a denúncia da vítima).
70.2. Auto de prisão em flagrante: Lavrado na delegacia de polícia civil. Ocorre assim que a pessoa comete o crime ou no momento em que está cometendo e, ao chegar na delegacia, são apurados: Data, local, fatos, circunstâncias do flagrante, quem foram os responsáveis pelo flagrante e os policiais condutores.
70.2.1. Flagrante próprio: Quando há apenas indicios de que o crime acabou de ser cometido.
70.3. Requisição: Pelo MP ou órgão administrativo.
71. Serendipidade: Encontro fortuito de prova ao investigar outra prova. Há liberdade de encontrar coisas novas porém as provas obtidas por meios ilícitos não são válidas, apenas se forem obtidas por meio de perícia.
72. Inquérito policial: Procedimento administrativo.
72.1. Agente de policia: Não pode instaurar nem relatar inquérito policial, apenas executar diligências sob orientação do delegado. Atua com o controle do MP sob supervisão do Judiciário.
72.2. Autoridade policial (Policia judiciária): Delegado de policia civil ou federal que indica autoria e materialidade do fato típico, ilícito e culpável.
73. Diligências (art. 6º CPP): Dever da autoridade policial.
73.1. Poder de policia: Há na autoridade policial o início e o fim da investigação.
73.2. Discricionariedade: Dar a autoridade administrativa a capacidade de discernir o que é relevante ou não para a execução de um ato administrativo. O dever das diligências é balizado por este princípio.
73.3. Efetuar isolamento do crime: De modo a preservar as provas presentes no local para que seja feita a perícia pelos peritos.
73.4. Apreender objetos que tiverem relação com o fato: O policial prende o suspeito, apreende o material, encaminha para a pericia da policia civil e esta emite o laudo constatando se o material é ilícito ou não (ex: A portaria 344/MS define as drogas ilícitas no Brasil).
73.5. Colher todas as provas que servirem ao esclarecimento dos fatos e suas circunstâncias: As provas devem ser admissíveis ao direito e produzidas por meios lícitos (ex: Documental e pericial). Muitas das provas são produzidas no inquérito (ex: Escutas telefônicas), cabe ao delegado definir quais serão as provas utilizadas.
73.6. Ouvir o ofendido (vítima): Quando puder ser ouvida.
73.7. Ouvir o indiciado: Oitiva do indiciado para que possa relatar a sua versão sem a possibilidade de reação. A lei 13.245 obriga a presença do advogado na ouvida.
73.8. Indiciamento: Quando houverem indícios de crime, faz-se a delimitação deste. Porém, se a delimitação já existe, o indiciamento não se faz necessário.
73.9. Reconhecimento de pessoas e coisas: Ocorre tanto na fase de inquérito quanto na fase judicial (Ex: Prova produzida na instrução processual).
73.10. Reconhecimento presencial: Após a prisão em flagrante, o detido é apresentado a vítima junto a outros de perfil semelhante
73.11. Corpo de delito: Quando o crime deixa vestígios (ex: Lesão corporal, tentativa de homicídio, entre outros crimes materiais que deixam vestígios).
73.12. Quaisquer outras perícias: Grafotécnica, contábil, datiloscopia entre outras definidas pela autoridade policial ou juizes.
73.13. Noticia crime: Comunica-se o crime a autridade policial.
74. Silêncio: O direito de silêncio não implica em aceitação, ao mesmo tempo que é facultado ao indiciado responder ou não às perguntas do inquérito pois não produzirá provas contra si (art. 5º, LXIII, CF).
75. Redução à termo: A oitiva deve ser reduzida à termo e todos os presentes devem assinar.
76. Hierarquia de provas: A prova pericial não tem hierarquia no valor das provas, sendo fundamental para a identificação de alguns crimes.
77. Folha de antecedentes: Registros criminais dos últimos 5 anos.
78. O inquérito policial1 tem um significado importante na construção das relações jurídico-penais no
Brasil (BEATO FILHO, 1999; BONNELLI, 2003b; CAVALCANTI, 2003; HOLLOWAY, 1997; LIMA,
2003; MACHADO, 2007a, 2007b e 2011; MISSE, 2010; SADEK, 2003; SANCHEZ FILHO, 2000;
SOUZA, 2003 e 2010). Em outras tradições, foram idealizados modelos distintos, outras
organizações e atores entraram em cena, novos papéis foram assumidos.
O modelo de investigação sob presidência do juiz instrutor, hoje em aparente extinção, seguindo a
experiência francesa, propiciou relações mais próximas entre o Judiciário e a Polícia. Na medida em
que os modelos são modificados e o promotor de justiça assume o papel instrutor, nos deparamos
com novos cenários, novos dramas (MACHADO, 2007b e 2011). Na Inglaterra, a Polícia assumiu
tradicionalmente um papel protagonista na investigação. A sua tarefa prosseguia até o oferecimento
da ação penal, em um modelo em que o policial não se despia da farda ao assumir a toga. As
mudanças recentes no modelo inglês sinalizam uma diferenciação interna do subsistema
jurídico-penal, no qual o Ministério Público assume um papel mais relevante.2
No caso brasileiro, o processo de diferenciação do sistema jurídico, assim como o processo de
diferenciação interna do sistema jurídico em subsistemas, acentuou a interação entre organizações
que tradicionalmente estiveram vinculadas ao sistema político (Polícia, Ministério Público) com
organizações típicas do sistema jurídico (MACHADO, 2011, p. 277-282; LUHMANN, 2005a, p.
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INTERAÇÃO: DISCURSOS SOBRE O INQUÉRITO
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359-367).
No Brasil, antes da criação do inquérito policial, investigar e julgar eram tarefas afetas ao magistrado,
o que dificultava a diferenciação interna do subsistema jurídico-penal. A clara separação entre
funções e profissionais incumbidos de investigar e julgar, em 1871, concorre para a construção de
um ethos próprio: o ethos policial (BONNELI, 2002; COSTA, 2005; HOLLOWAY, 1997; MACHADO,
2011; SOUZA, 2003, 2010). A redefinição dos papéis propiciada pela idealização de um novo modelo
promove a ressignificação de práticas e dos papéis.
Na divisão social do trabalho policial, as hierarquias são construídas a partir de técnicas -
saberes-poderes, no sentido foucaultiano -, e saberes acumulados e transmitidos no interior do
grupo, conformando a expertise policial, difundida e reproduzida nas academias de Polícia como
teoria e técnica da investigação. A legitimação interna e em relação ao público e demais
organizações associa-se à busca da verdade, a verdade policial (LIMA, 2003, p. 241-256).
A criação da figura do delegado de Polícia, profissional da mediação entre o ethos policial e o mundo
do direito, consolidou novas práticas e interações entre distintos atores (BONNELLI, 2003b; SADEK,
2003; SOUZA, 2003 e 2010).3 Cada ator que participa do processo de produção da verdade policial
investe e valoriza o desempenho das funções. Como se cada ato formalizado, carimbo, redução a
termo de entrevistas, interrogatórios, fossem peças articuladas desta engrenagem. Os documentos
que materializam as decisões da organização policial (conclusões, verdades) fazem parte desse
universo.
O paradigma sistêmico sugere novas possibilidades de pesquisa empírica das organizações do
subsistema jurídico-penal. O giro mais importante é a compreensão das organizações como sistemas
que comunicam por meio de decisões. Cada decisão permite a redução de complexidade e novas
decisões. As organizações também estão inseridas nos processos de diferenciação funcional, e
tendem a assumir a codificação dos distintos sistemas com os quais revela proximidade (LUHMANN,
2005, 2007, 2010).
Este parece ser o caso paradigmático do sistema jurídico e sua diferenciação interna em tribunais.
Não é descabido, porém, falar-se em organizações polifônicas, na hipótese em que a codificação
organizacional orienta-se por mais de um sistema social (ANDERSEN, 2003). De outro ângulo,
embora as pessoas (sistemas psíquicos) não sejam o foco principal de análise, os diversos sistemas
de interação que eventualmente surgem nas organizações e entre membros de diversas
organizações constituem em objeto que não deve ser desconsiderado, pois as interações
organizacionais podem repercutir diretamente nas decisões das organizações (SEIDL, 2005, p.
145-170). Assim, os sistemas de interação permitem adensar o conhecimento de premissas
decisórias, tais como a cultura organizacional.
Neste artigo pretendemos, sob um enfoque organizacional-sistêmico, analisar as representações
sociais de membros de distintas organizações do subsistema jurídico-penal em relação ao inquérito
policial. Definimos as representações sociais como imagens e símbolos construídos socialmente a
partir das interações entre os atores que integram as referidas organizações do sistema de justiça,
condicionadas pelas experiências compartilhadas e expectativas em relação ao desempenho das
atividades, pela cultura profissional e pautas organizacionais.4
Para análise dos discursos utilizamos o material empírico produzido a partir dos grupos focais (GF) -
sistemas de interação na abordagem sistêmica (LUHMANN, 2007, p. 643-645; LUHMANN, 2010, p.
45) -, realizados no Distrito Federal com magistrados, promotores de justiça, delegados de Polícia e
agentes de Polícia.
2. COMUNICAÇÃO, ORGANIZAÇÕES E INTERAÇÕES SOCIAIS
2.1 Teoria organizacional sistêmica: precisões conceituais
A teoria organizacional sempre esteve no centro das preocupações teóricas de Luhmann (1997,
2007, 2010). Assim como o neoinstitucionalismo, o foco dirige-se às interações entre as
organizações e a sociedade.5 O enfoque institucionalista surge, como ponto de partida para análise
da teoria sistêmica, exatamente pela conexão entre as formas organizacionais e o contexto social,
bem como para análise dos processos organizacionais internos, aspecto negligenciado pelo
neoinstitucionalismo (HASSE, 2005, p. 253; LUHMANN, 2010, p. 56 e ss; ROWAN; MEYER, 1977, p.
interaction: discourses on the police inquiry
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41). Porém, as organizações são unidades com racionalidade e dinâmica próprias na ótica
luhmanniana.
Diferentemente da tradição sociológica clássica, centrada na ação social, o ponto de partida da teoria
sistêmica são as comunicações, as quais não são definidas sob viés psicológico, mas como
processo de produção de sentido a partir de um emissor, de um transmissor e de um receptor de
determinada mensagem. A compreensão como processo que possibilita a comunicação não se
vincula a um sujeito cognoscente, mas à produção de sentido que enseja novas comunicações
(LUHMANN, 2007, p. 49).
O ponto central na teoria sistêmica é a diferenciação dos sistemas sociais autopoiéticos na
sociedade contemporânea. A política, a economia, o direito, a religião e a moral funcionam a partir de
códigos e programas próprios. Este processo de diferenciação funcional está associado à criação de
organizações especializadas, tais como as universidades, os tribunais, bancos e igrejas (LUHMANN,
2007, p. 666-672; LUHMANN, 2005b, p. 105). Neste processo, as organizações acabam assumindo
códigos e programas dos sistemas funcionais, conformando certa identidade organizacional. O
sistema jurídico, por exemplo, diferencia-se, internamente, na forma de tribunais (LUHMANN, 2005a,
p. 359-367).
A abordagem permite novos enfoques sobre temas relevantes do ponto de vista sociológico, tais
como a integração e a mudança, pois as organizações são definidas teoricamente como os únicos
sistemas sociais que podem se comunicar car entre si, o que decorreria da duplicidade de papéis. As
organizações são sistemas sociais que internalizam códigos e programas dos sistemas sociais. Por
outro lado, podem ser definidos como atores, que se comunicam em situação análoga às pessoas
(LUHMANN, 2007, p. 668; HASSE, 2005, p. 256).6
2.2 As organizações como sistemas sociais distintos
O ponto de partida da teoria organizacional sistêmica foi a crítica ao modelo weberiano - a burocracia
como modelo de organização racional. A teoria organizacional clássica concentrou-se em aspecto
fundamental: a redução de complexidade. A redução da incerteza foi construída como aspecto
preponderante para a proteção da organização do risco e do excesso de informação (LUHMANN,
2010, p. 29 e ss).
Com a definição das organizações como sistemas sociais compostos de decisões e que produzem
as próprias decisões, - entidades autorreferentes -, deve-se repensar a concepção que considera a
organização como mero subsistema diferenciado internamente a partir dos diversos sistemas
funcionais (SEIDL, 2005, p. 39). Mais recentemente, com a difusão de organizações formais e maior
complexidade social a atenção dirige-se às relações entre organizações e sistemas funcionais, na
medida em que as organizações aparecem como pressuposto para a diferenciação funcional.
Neste modelo teórico, as organizações são definidas como sistemas sociais autopoiéticos que
produzem decisões por meio de rede de decisões autoproduzidas - máquinas não triviais (Von
Foerster) (LUHMANN, 2005b, p. 105; LUHMANN, 1997, p. 9). Diferente da tradição organizacional,
que define decisões como escolha entre alternativas, a decisão apresenta-se como comunicação,
não se constituindo exatamente em produto humano. As decisões comunicam que alternativas
poderiam ter sido escolhidas (LUHMANN, 2005b, p. 86).7
No modelo sistêmico as decisões surgem como comunicações paradoxais: decidir significa converter
incerteza em risco (LUHMANN, 1997, p. 10). O sentido autorreferente na organização tem outras
consequências, pois a modificação das decisões deve ser comunicada como decisão. Do contrário,
deixa de ser parte da autopoiese organizacional. A fim de absorver incerteza, as comunicações
decisórias devem ser integradas em processo de conexão entre decisões (LUHMANN, 1997, p.
14-15; LUHMANN, 2005b, p. 96-97).
Na medida em que as organizações atuam em sistemas funcionais, vinculam-se aos respectivos
códigos. Mas estes não são suficientes para demarcar os limites organizacionais. Assim, as
premissas decisórias, conjunto de distinções binárias - esta competência e não outra, esta pessoa e
não aquela -, conformam o equivalente funcional da codificação dos sistemas funcionais (LUHMANN,
2010, p. 279).
A partir das informações disponíveis, e apesar da incerteza ainda existente, possibilita-se a decisão.
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Na conexão que se estabelece com decisões posteriores, a incerteza da primeira decisão é
absorvida (LUHMANN, 2005b, p. 99). Em outras palavras, a redução de incerteza ocorre quando a
decisão é usada por decisão subsequente como premissa decisória (LUHMANN, 1997, p. 38).8
Entre as premissas decisórias, destacam-se: programas, pessoal e canais de comunicação. Os
programas, responsáveis pela estruturação da memória do sistema, distinguem-se entre programas
condicionais (orientados pelo input) e finalísticos (orientados pelo output) (LUHMANN, 2010, p. 261 e
ss). O pessoal refere-se à necessidade prévia de recrutamento e organização do pessoal
(LUHMANN, 1997, p. 71; LUHMANN, 2010, p. 304-311). Os canais de comunicação constituem-se
na organização interna, com organograma pré-estabelecido com competências e vias de
comunicação, coordenados por meio de posições referentes à execução de programas específicos
(LUHMANN, 2005b, p. 94-95). Luhmann introduz outras premissas em obra póstuma: premissas de
decisão que não são passíveis de decisão. A cultura organizacional (ou culturas organizacionais),
forma como a organização lida com os processos decisórios; as rotinas cognitivas, premissas
heterorreferentes, referem-se a como o entorno é definido pela organização. Por rotinas cognitivas
entende-se não o que percebem todos os indivíduos envolvidos na organização, mas as
identificações registradas pelo uso reiterado nas comunicações, e que podem ser recuperadas
segundo a necessidade (LUHMANN, 2010, p. 219).
Outro aspecto importante na análise da autopoiese organizacional são as formas e mecanismos de
fechamento em relação ao entorno. O fechamento organizacional manifesta-se operacionalmente, na
medida em que as organizações se reproduzem por meio de decisões (LUHMANN, 2005b e 2010).
Por outro lado, a decisão é paradoxal, pois apenas as questões a princípio não passíveis de decisão
podem ser decididas (Von Foerster) (LUHMANN, 2005b, p. 44). Em suma, em situação real de
decisão, as alternativas são equivalentes, ou não haveria alternativas. Para evitar a paralisação o
paradoxo deve ser desparadoxizado, na medida em que sai do campo visual (LUHMANN, 2005b, p.
92). Cada decisão é uma distinção entre o que é um elemento da organização (espaço delimitado,
Spencer Brown) e o que não pertence à organização.
A abordagem organizacional-sistêmica permite distintos níveis de análise. Inicialmente, surge como
possibilidade empírica pesquisar os processos de diferenciação interna do subsistema jurídico-penal
e suas formas de comunicação a partir da codificação jurídica. Outra perspectiva, mais
especificamente organizacional, focaliza as decisões organizacionais da Polícia, o Ministério Público
e o Judiciário. Em que medida tais decisões reduzem complexidade e permitem sucessivas
decisões? Para isso, a pesquisa pode ser reorientada para as interações organizacionais entre os
membros das distintas organizações. Finalmente, cumpre indagar sobre as premissas decisórias,
especialmente a cultura organizacional, razão pela qual se revela útil investigar representações
sociais dos membros das distintas organizações pesquisadas.
2.3 Processos decisórios, cultura e mitos organizacionais
O modelo organizacional sistêmico propicia ferramentas alternativas para análise organizacional. A
abordagem não parece, contudo, totalmente incompatível com parte da contribuição do
neoinstitucionalismo. A compreensão das rotinas cognitivas e definição do entorno pelas
organizações permitem adensar a compreensão sobre os processos decisórios. A análise da
autopoiese da comunicação organizacional pressupõe o conhecimento dos mecanismos de
insulamento das organizações.
No enfoque institucionalista, o principal instrumento de isolamento constitui-se o mito institucional,
definido como representações sociais relacionadas às estruturas e funções da organização, com
elevado grau de impessoalidade, atuando como mecanismo que atribui natureza técnica às práticas,
meios e fins da organização (ROWAN; MEYER, 1977, p. 343-345).
Os mitos organizacionais relacionam-se a três processos: o conjunto de relações sociais
compartilhadas entre organizações em um mesmo ambiente, cuja socialização leva à consolidação
de estruturas e práticas; o processo de normalização das práticas por meio do direito positivo, que
define de forma clara o exercício de uma determinada ocupação; finalmente, o papel das lideranças
organizacionais na construção social dos mitos e na atribuição de novos significados aos já
existentes (ROWAN; MEYER, 1977, p. 343-352).
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As organizações do sistema de justiça estão fortemente influenciadas pelo ambiente institucional.
Pesquisas realizadas sugerem que a legitimidade conferida às práticas policiais é inspirada pelo
ideário hegemônico e seus mitos institucionais (MEDEIROS, 2004; COSTA, 2005). Há evidências
empíricas de que a legitimidade das práticas de outras organizações do subsistema jurídico-penal
também pode estar associada à cultura e mitos organizacionais (MACHADO, 2007a, 2007b e 2011).
Ao analisar o ambiente institucional, estudos no campo da teoria organizacional associam-no a uma
forma de campo institucional. Este seria marcado por processos de isomorfismo entre as
organizações que compartilham determinadas pautas de atuação, fonte de legitimidade e mitos
institucionais. Aponta-se a tendência de homogeneização de instituições entre as organizações que
ocupam um mesmo campo. Este processo manifesta-se na tendência de aproximação das unidades
ao restante do grupo (POWELL; DIMAGGIO, 1983, p. 147-160).9
A fim de ganhar legitimidade, as organizações atuam e se estruturam de acordo com as expectativas
do entorno. Por isso, os papéis são assumidos e representados ritualmente, a fim de revelar
conformidade. Nesse processo ritualístico, em busca da legitimidade, há separação das práticas
organizadas das estruturas formais. A seletividade surge no interior das organizações, entre práticas
e rotinas, por um lado, e estruturas formais e processos, por outro (POWELL; DIMAGGIO, 1983, p.
147-150; ROWAN; MEYER, 1977, p. 344-346).
Outro mecanismo de seletividade parte dos campos organizacionais, constituídos por profissões e
agências reguladoras. As organizações são, assim, afetadas diretamente pelas mesmas profissões e
regras. No processo denominado como isomorfismo, as organizações buscam adaptar suas
estruturas a fim de obter mais legitimidade (POWELL; DIMAGGIO, 1983, p. 152-153).10
Os processos descritos pelo neoinstitucionalismo não são incompatíveis com a abordagem
sistêmica. Certamente existem diferenças muito importantes. Na tradição institucionalista a pesquisa
concentra-se na manutenção ou transformação das estruturas organizacionais como resposta ao
entorno. Por outro lado, a proposta sistêmica parte da autopoiese das organizações. Como sistemas
operativamente fechados, o entorno pode suscitar irritações e estimular processos organizacionais
internos. Uma releitura sistêmica do isomorfismo deve considerar que não se trata da ação do
entorno, mas da autoprodução das organizações, operativamente fechadas e cognitivamente
abertas. Os processos de diferenciação interna do sistema jurídico ocorrem também pela criação de
organizações que assumem a codificação e programas deste sistema funcional (LUHMANN, 2005a,
p. 359-367).11 Porém, existem sistemas concorrentes com o sistema jurídico; além disso, no
processo de diferenciação funcional as organizações muitas vezes assumem a codificação de mais
de um sistema social, configurando organizações polifônicas (ANDERSEN, 2003, p. 151-182;
NOBLES; SCHIFF, 2001, p. 197-201).
De outro ângulo, os mitos organizacionais também são úteis para a análise organizacional-sistêmica,
pois se aproximam do que Luhmann define como valores. Estes atuam como mecanismos de apoio
nas comunicações, ainda que não comunicados diretamente. Em geral, a validade dos valores é
pressuposta nas comunicações (LUHMANN, 2010, p. 285). Os valores podem se manifestar na
forma de mitos, atuando como premissa decisória; ou seja, relacionam-se à cultura organizacional e
à forma de comunicação das organizações. A peculiaridade da cultura (ou culturas) organizacional
de uma dada organização remete à sua história. Assim, pode-se repreender eventuais desvios da
cultura organizacional (LUHMANN, 2010, p. 285-286).
3. ORGANIZAÇÕES DO SUBSISTEMA JURÍDICO-PENAL: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
SOBRE O INQUÉRITO POLICIAL
3.1. Metodologia e técnicas de pesquisa
Entre 2008 e 2009, a convite da Federação Nacional de Policiais Federais, foi realizada pesquisa
empírica sobre o inquérito policial no Brasil, selecionando-se unidades de investigação em cinco
capitais brasileiras: Belo Horizonte, Brasília, Recife, Porto Alegre e Rio de Janeiro. A pesquisa
utilizou-se de metodologias quantitativas e qualitativas e contou com coordenadores vinculados a
distintas universidades, em cada local selecionado para a investigação: Michel Misse no Rio de
Janeiro; Arthur Costa em Brasília; Joana Domingues Vargas em Belo Horizonte; José Luiz Ratton em
Recife; Rodrigo G. de Azevedo em Porto Alegre (MISSE, 2010, p. 15-16).
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Entre os achados das pesquisas realizadas nas referidas capitais brasileiras, destacamos: o
descompasso entre as rotinas de policiamento preventivo das Polícias Militares e a investigação
realizada pelas Polícias Civis; o conflito constante entre o “saber dos tiras” ou “saber policial
investigador” e o “saber dos delegados de Polícia”. Em alguns estados, foram reiteradas as críticas à
rotatividade de policiais e delegados e às interferências políticas. Além disso, há baixa capacidade
de elucidação de crimes graves, o que contrasta com o excessivo zelo em relação às exigências
cartorárias e à formalização dos procedimentos de investigação (MISSE, 2010, p. 16-18).
No Rio de Janeiro, a experiência das centrais de inquéritos instituída pelo MPRJ não produziu
exatamente uma melhora nas relações entre Polícia e promotores de justiça. Alguns dos delegados
criticam a referida iniciativa e insistem em remeter os autos à Justiça. Policiais e delegados de polícia
criticam também que os promotores não dominariam técnicas de investigação e que não
conheceriam sequer a realidade das delegacias, muitas vezes requisitando o inviável. Os promotores
de justiça, por outro lado, reclamam que os delegados são passivos e esperam as promoções do
Ministério Público (MISSE, 2010, p. 65-68).
Na pesquisa realizada em Belo Horizonte, as percepções dos sujeitos da pesquisa sugerem
desarticulação entre as atividades de policiais/ delegados e promotores de justiça. Os delegados
aludem ao afastamento do Ministério Público da investigação, limitando-se a ratificar o trabalho
policial. O relacionamento seria estritamente protocolar, marcado pela disjunção entre as formas de
atuação das duas organizações, o que não decorre da suposição de boa-fé e confiança recíprocas.
Ao contrário, as entrevistas revelaram críticas mútuas entre os membros das referidas instituições
(VARGAS, 2010, p. 102-190).
Na fala dos delegados há uma certa amargura ao referir-se aos promotores de justiça como “bem
nascidos”, os quais teriam tido todas as condições, mas pouco contato com a dureza da vida,
sugerindo discurso marcado por ethos sociais distintos. Os agentes criticam o papel dos delegados,
algumas vezes representado como “rainha da Inglaterra” do inquérito policial, pois quem decide é o
promotor (VARGAS, 2010, p. 173-176). Entre os promotores de justiça, algumas das falas remetem à
suposta perda da centralidade do inquérito policial. Tal mudança é avaliada positivamente, e descrita
como passagem de um “Estado policialesco” para um “Estado de garantias” (VARGAS, 2010, p.
181). Avalia Vargas que as relações de desconfiança e a conflituosidade entre polícia e Ministério
Público preocupa pois são organizações interdependentes. Deveria ser buscada a relação de
confiança entre policiais, promotores de justiça e juízes, pois a aproximação poderia levar à
diminuição dos trâmites burocráticos (VARGAS, 2010, p. 185).
A pesquisa realizada em Recife sugere conflitos entre delegados e promotores de justiça. A
devolução do inquérito para o prosseguimento das investigações gera reações “pouco amistosas”
entre os policiais. Estes ressentem da falta de compreensão da investigação e das condições de
trabalho dos policiais (RATTON, 2010, p. 290-292).
Entre os delegados entrevistados em Porto Alegre, há uma crítica generalizada à forma como se
pretenderia realizar o controle externo. Além disso, o foco das investigações do Ministério Público
estaria associado à projeção na mídia, deixando os casos rotineiros para a polícia. O controle
externo é retratado como deficiente e burocrático, descuidando de um foco mais amplo, como a
implementação de políticas públicas por meio de ações civis que dotassem a polícia de melhores
condições e estrutura (AZEVEDO, 2010, p. 360-367).
3.2 O fluxo do inquérito policial no Distrito Federal
No Distrito Federal, a pesquisa compreendeu diferentes metodologias e etapas. Inicialmente, foram
realizadas etnografias em uma delegacia de Polícia. Em seguida, analisou-se o fluxo do inquérito
policial em homicídios. Finalmente, foram realizados grupos focais com agentes da Polícia Civil,
delegados da Polícia Civil, promotores de justiça e magistrados (COSTA, 2010, p. 210-236). Os
grupos focais com cada categoria profissional foram assim distribuídos: 9 promotores de justiça; 7
juízes de direito; 6 delegados de Polícia; 6 agentes de polícia.
Na pesquisa coordenada por Costa, a partir de análise longitudinal do fluxo dos inquéritos policiais
pela prática de homicídios dolosos, constatou-se que foram registrados 556 homicídios no Distrito
Federal em 2004, dos quais 311 originaram procedimentos judiciais, e 87 constam nos arquivos do
TJDF.
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Do total identificado nos arquivos do TJDF, 64 originaram inquéritos policiais por portarias e 23 por
auto de prisão em flagrante. Deste total, 68 foram denunciados pelo Ministério Público, o que levou a
49 sentenças de pronúncia e encaminhados ao Tribunal do Júri. Entre os pronunciados, 22
receberam sentença condenatória final (COSTA, 2010, p. 221-230). Costa analisa que apenas 25,3%
dos inquéritos concluídos pela polícia resultaram em condenação, o que sugere reflexões sobre as
interações da polícia com outros atores do sistema penal, especialmente o promotor de justiça e o
juiz (COSTA, 2010, p. 223).
A análise quantitativa evidencia mais que decisões comunicadas por organizações distintas. Sugere
processos interpretativos na construção jurídica dos fatos, o que justifica aprofundar o conhecimento
da cultura organizacional das organizações do subsistema jurídico-penal.
Na pesquisa realizada no Distrito Federal, identificou-se pouco contato entre policiais e magistrados.
Entre estes, a reclamação generalizada é a falta de comprometimento daqueles com os processos
iniciados pelas investigações policiais. Os contatos entre promotores e delegados seriam “distantes e
formais”. Apenas nas delegacias e promotorias especializadas os contatos seriam mais frequentes.
Nestas, os casos seriam resolvidos com padrões probatórios que atenderiam às demandas (COSTA,
2010, p. 231).
Neste artigo optamos por analisar os discursos dos atores das organizações selecionadas na
pesquisa.12 Se a pesquisa quantitativa aponta razoável divergência na construção jurídica dos fatos,
argumentamos que isso se deve a distintos fatores, organizacionais e profissionais. Certamente, as
trajetórias das organizações analisadas e a cultura profissional favorecem o insulamento destas
organizações do sistema político (BONNELI, 2002, 2003a; MACHADO, 2007 a, 2007b e 2011).
4. OS GRUPOS FOCAIS (GF) COMO SISTEMAS DE INTERAÇÃO: DISCURSOS SOBRE O
INQUÉRITO POLICIAL
Do material empírico produzido durante a pesquisa, selecionamos as representações sociais a partir
dos grupos focais realizados em Brasília. Sob o enfoque sistêmico, cada grupo focal deve ser
analisado como um sistema de interação concreto (LUHMANN, 2007, p. 644-647). Do ponto de vista
metodológico, analisamos o discurso de profissionais que integram diferentes organizações do
sistema de justiça criminal.
Cada grupo focal (GF) configurou, assim, um sistema de interação composto por integrantes de uma
única categoria profissional e os pesquisadores responsáveis pela condução da interação. Por
constituírem sistemas de interação, a presença/ ausência orienta as comunicações. A análise dos
discursos que emergem dos referidos sistemas de interação são relevante para adensar o
conhecimento das organizações envolvidas, pois revelam mitos (e valores) e desvendam parte da
cultura organizacional (premissa decisória).13
4.1 O poder de papel e os papéis do poder: imagens sobre o relatório final
Se14 as organizações comunicam por meio de decisões, estas, em regra, se concretizam em
documentos e relatórios. A produção do inquérito policial sugere a comunicação por meio de
decisões de diferentes organizações do sistema de justiça criminal. Os relatórios produzidos pelos
membros da organização policial consubstanciam decisões organizacionais. Por meio de decisões
há uma redução de complexidade e possibilitam decisões subsequentes.
O relatório preliminar das Seções de Investigação Preliminar, elaborados pelos agentes de Polícia, é
parte importante na construção da verdade policial. O relatório final, sob responsabilidade do
delegado de Polícia, encerra a formalização dos atos cartorários que buscam verossimilhança com a
prática judicial. Simbolicamente, representaria o momento em que o saber jurídico encamparia o
saber policial; a verdade policial ganharia contornos jurídicos. A autoridade e o poder de definição
jurídica do fato aproximam-se do que Bourdieu sugere como poder de nomeação no campo
jurídico-penal (BOURDIEU, 2001). Nas falas de agentes de Polícia, delegados de Polícia e
promotores de justiça, algumas destas questões aparecem repetidamente.
O relatório final aparece na imagem descrita pelos delegados de Polícia como “espelho da
denúncia”. Sob um enfoque sistêmico, o relatório cristaliza decisão organizacional que busca traduzir
a investigação policial à codificação jurídica (LUHMANN, 2005a, 2005b). A simbologia do espelho
tem uma dimensão importante para os delegados de Polícia. O relatório constitui-se na
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materialização da decisão final em relação à investigação. Comunica-se a verdade policial. Além
disso, tem outra dimensão relevante sob o enfoque comunicativo. A verdade policial seria
reconstruída sob o prisma do direito como meio de comunicação simbolicamente generalizado:
“Delegado 5 - O que faz um relatório de delegado bom? Disso porque o que o que faz o relatório de
um agente é indicar quem foi, e como que ele chegou ali, porque que ele (…) o que faz um bom
relatório de delegado é ele conseguir transformar o mundo dos fatos numa linguagem jurídica. Então,
nesse sentido, o delegado tem o papel eu diria, tem, ele tem um papel transcendental. Um bom
relatório consegue fazer a costura entre o que foi apurado e o que é necessário pra fundamentar
uma boa denúncia, ou seja (…) na verdade, um bom relatório é o espelho de uma boa denúncia.
(…)”
“Delegado 2 - Você pode ter uma situação em que o relatório aponta autoria, dá as razões pelas
quais o investigador tá convicto de que o autor foi aquele, e o trabalho do inquérito e do delegado é
transformar aquela verdade em algo juridicamente verdadeiro. Então muitas vezes o agente não
consegue fazer essa transposição (…)”
Esta visão contrasta com a avaliação dos promotores de justiça. O relatório policial seria uma
formalidade que muitas vezes prejudicaria a proposição da ação penal. Anteciparia conclusão
jurídica muitas vezes descabida, atrapalhando o trabalho do promotor de justiça na fase judicial. Nos
relatos dos promotores de justiça, aparece também a construção subjetiva das hierarquias entre as
organizações do subsistema jurídico-penal. O inquérito teria um papel auxiliar, funcional para a ação
penal, e deveria ser estritamente informativo. A definição jurídica seria atribuição do Ministério
Público:
“Promotor 1: Relatório de inquérito pra gente é algo praticamente inútil. Concordam com a afirmação
que eu tô fazendo? O que a gente precisa, como promotor de justiça no inquérito, não é de uma
síntese daquilo que aconteceu. A gente precisa de informação. Então: a testemunha viu ou não viu?
Você tava lá? Eu tenho arma apreendida? (…)”
“Promotor 3: Na verdade, só pra gente não perder o foco do caso, que embora os delegados não
gostem disso, os relatórios só nos atrapalham.”
Na avaliação recíproca sobre os papéis desempenhados por diferentes membros da organização
policial, a função do agente de polícia também surge nos discursos documentados nos diferentes
sistemas de interação deflagrados pelos grupos focais. Nos relatos é possível identificar o significado
dos atos cartorários para os distintos sujeitos da pesquisa. As relações estabelecidas entre os atores
que se encontram durante a investigação policial, seja cara a cara ou pela produção de atos e
formalização de documentos (comunicações por meio de decisões), evidenciam os limites entre o
saber dos tiras e o saber jurídico.
A atividade desempenhada pelo agente de polícia aparece na fala dos promotores como útil para a
“busca da verdade real”. Sob o enfoque organizacional, as decisões policiais (comunicação) são
avaliadas por membros de outra organização (Ministério Público) como relevantes para a teleologia
do processo penal. Em términos sistêmicos, reduzem a complexidade e permitem outras decisões.
Os agentes de polícia, por outro lado, sentem-se valorizados ao identificar que o mundo do direito
aceitou a “verdade policial”, ainda que de forma provisória. A comunicação da organização Ministério
Público por meio de uma decisão concreta, o oferecimento da denúncia, depende, em regra, de
decisões anteriores de outras organizações.
A divisão do trabalho entre os membros da organização policial sugere, assim, significados distintos
para os agentes de polícia:
“Agente 4 - Tanto é que, quando ele pega o inquérito, ele pega o processo, ele chega lá no relatório,
vê quem produziu, eu vejo quem é essa pessoa, coloco uma testemunha. Eu lembro de uma prisão,
que a gente foi chamado, eu e meu parceiro, quando chegamos na audiência e o promotor leu a
denuncia, todas as linhas da denuncia era o relatório que a gente fez. Eram 11 pessoas
denunciadas. A denúncia dele era o relatório que a gente fez.”
4.2 Polícia e Ministério Público: redefinindo os papéis do delegado de Polícia e do promotor
de justiça
interaction: discourses on the police inquiry
Página 8
A experiência brasileira mostra que o papel do delegado de Polícia no inquérito policial decorre de
peculiaridades históricas. Parte da literatura refere-se à advogadização da profissão delegado de
Polícia (BEATO FILHO, 1999; SOUZA, 2003, 2010). O rótulo remete a um profissional da área
jurídica que assume a direção da investigação policial. O que se explica não apenas pelo modelo
anterior, em que a presidência cabia a um funcionário que acumulava funções policiais e
jurisdicionais, mas também pelo peculiar papel que lhe é atribuído (HOLLOWAY, 1997; SOUZA,
2003, 2010). Sob a ótica sistêmica, a tradução do saber policial aos códigos do subsistema
jurídico-penal. Entre os profissionais das organizações pesquisadas, o papel e importância deste
funcionário está longe de ser unânime.
No sistema de interação com os delegados de Polícia a relevância do papel do delegado como
membro da organização policial aparece nas representações do profissional como responsável pela
conexão entre o saber “dos tiras” e o saber jurídico. Os delegados valorizam a sua importância como
gestor da investigação. O profissional que domina a técnica jurídica; e próximo do dia a dia da
delegacia, do saber dos tiras e da investigação:
“Delegado 3: A diferença seria que o delegado, ele - uma expressão muito usada na doutrina de
Portugal - é o motor de arranque do processo. (…) Mas ele trabalha a investigação inquirindo,
indagando, pra descobrir o que, como, quando, onde, trazer esses elementos. O Ministério Público
não. A função dele é deflagrar a ação penal, a partir dessas informações. (…) Então o modelo
brasileiro foi criado com essa função, dois bacharéis em direito. (…)”
“Delegado 5 - Na prática, eu vejo a persecução criminal como uma corrida de bastão. Não vou
discutir a importância de um ou de outro. O fato é que você pode mudar o nome de inquérito pra
qualquer outra coisa, você pode mudar o nome do delegado, mudar os atores, mas não tem,
independente dos atores que estão em questão, ou da nomenclatura que se utiliza, não tem como
começar um processo criminal em juízo sem uma instrução prévia, uma investigação preliminar (…)”.
No sistema de interação com os magistrados, aparecem distintas imagens sobre o papel do
delegado de Polícia. Entre os magistrados, o papel do delegado evidencia divergência sobre as
funções que este servidor público deve desempenhar. O papel de presidência do inquérito policial
não é associado exclusivamente ao delegado. Em outras palavras, a tradução do saber dos tiras aos
códigos do sistema jurídico poderia ser feita pelo promotor de justiça. Há quem entenda que o
promotor de justiça deveria assumir a função do delegado; outros divergem. O promotor não estaria
preparado para isso. As funções seriam outras, a capacitação requereria técnicas que ele não
disporia:
“Juiz 1 - (…) Eu acho que nós precisamos mudar várias coisas no sistema penal em geral, desde a
investigação até o processo, até a área penitenciária mesmo, depois, de execução da pena. Mas eu
acho que tem muitos, muitos agentes nessa história. Eu acho que a figura do delegado de polícia,
numa reforma, [pode] ser condensada na figura do promotor. Os delegados não gostam quando
ouvem isso, os promotores odeiam quando ouvem isso, mas o ponto que nós estamos caminhando,
a figura do delegado tá ficando absolutamente desnecessária.”
Entre os promotores de justiça predomina a visão de que o delegado “estaria sobrando”, pois o
promotor de justiça deveria assumir a direção da investigação. A Polícia não estaria preparada para
a investigação de determinados crimes, tais como os praticados contra a administração pública. Os
relatos sugerem corporativismo da Polícia, e ressentem que não haveria nenhum indiciamento pela
prática de tortura no Distrito Federal. Porém, as falas revelam autocríticas. O promotor de justiça não
estaria cumprindo a função fiscalizadora do inquérito policial.
“Promotor 3 - De fato há uma superposição. Eu diria hoje o Brasil é o único país que tem essa figura
esdrúxula que é a do delegado. Não existe nenhum outro país no mundo que tem uma figura como é
a do delegado brasileiro […]”.
“Promotor 2 - A pergunta é qual é a diferença do promotor para o delegado. Eu penso que o cerne
está na diferença das instituições em que eles são formados. A instituição MP, ela permite ao
promotor de justiça uma maior visão da autonomia na sua prática. O promotor e o delegado são
produtos dessas instituições, então a diferença é do ponto de vista institucional. (…)”
“Promotor 6 - Ai da sociedade se tudo que vem da polícia fosse oficializado. Ai da sociedade, ai dos
JUSTIÇA CRIMINAL, ORGANIZAÇÕES E SISTEMAS DE
INTERAÇÃO: DISCURSOS SOBRE O INQUÉRITO
POLICIAL Criminal justice, organizations and systems of
Página 9
direitos humanos, ai do Estado democrático de direito se as garantias constitucionais não fossem do
Ministério Público. O grande filtro hoje é o Ministério Público.”
4.3 Presidir a investigação
Pesquisas realizadas mostram que o monopólio da investigação é um dos focos de atrito entre
promotores de justiça e delegados de Polícia. Estes ressentem das investidas do Ministério Público
em área tradicionalmente ocupada pela Polícia (BONNELLI, 2003b; CAVALCANTI, 2003;
MACHADO, 2007a, 2007b, 2011; SADEK, 2003; SANCHEZ FILHO, 2000). As críticas também se
dirigem às “intromissões indevidas” da Polícia Militar. Nas falas dos delegados, ambos não teriam
capacidade para investigar (HAGEN, 2005). A formação policial civil, as técnicas e experiências
acumuladas, bem como as práticas conformariam o “saber da Polícia Judiciária”. A diferenciação da
função policial investigativa no século XIX levou à aproximação desta organização do sistema
político (COSTA, 2005; HOLLOWAY, 1997; SOUZA, 2003). Os vínculos históricos com o Executivo,
as pressões políticas e das elites locais, os déficits de organização e profissionalização, assim como
a atividade desempenhada, coloca em tensão a investigação de determinados crimes com o papel
tradicional da polícia, de manutenção da ordem, de exercício da violência legítima pelo Estado.
Nos sistemas de interação com os distintos membros das organizações pesquisadas, as
representações sociais sugerem diferentes percepções e imagens sobre temas concretos
relacionados ao inquérito policial. Os relatos sinalizam pistas sobre premissas decisórias (cultura
organizacional) que permitem adensar o conhecimento sobre a forma de comunicação das
organizações que participam da definição jurídico-penal (LUHMANN, 2005a, 2007, 2010).
4.3.1 Que crimes queremos investigar?
Pesquisa recente sobre a Polícia federal no Brasil analisa o surgimento e consolidação do que é
descrito como “elite” da Polícia brasileira. Ao contrário da imagem tradicional da polícia voltada
contra as classes menos privilegiadas, a Polícia Federal viria ocupando as páginas dos principais
jornais no Brasil pela atuação na repressão da corrupção e do crime organizado (BAJOTTO, 2009).
Nas falas dos promotores de justiça uma das questões recorrentes é a falta de independência da
Polícia. A sua organização e concepção original estariam voltadas à investigação dos delitos
tradicionais, mas não estaria preparada para a investigação de crimes de colarinho branco. Na
autoavaliação dos promotores, o Ministério Público ocuparia, então, este espaço, e teria mais
condições (insulamento do político) para conduzir tais operações. Mas, longe de prescindir da
Polícia, aparece a necessidade de usar a estrutura policial para investigar. A falta de experiência na
investigação também não é desconsiderada.
“Promotor 4 - O Ministério Público resolveu criar instrumentos fortes para investigar determinadas
coisas. Temos as operações citadas… Mas nós também temos as nossas operações. E as nossas
operações, como elas estão sendo conduzidas? Eu acho que discutindo as operações dos
delegados nós podemos refletir sobre as nossas próprias operações. Será que nós temos também
condições, estamos preparados para investigar? Eu não sei. Porque a nossa formação não é essa
(…)”
“Promotor 3 - Eleger o que investigar é poder. É a maior moeda política que a polícia tem a oferecer
aos governantes toda vez que tomam posse (…)”
“Promotor 5 - A polícia fala assim: “vocês não querem investigar o caso do ladrão de galinha (…)”.
Vocês só querem investigar quando vai para o Jornal Nacional (…)”.
Os relatos dos promotores de Justiça sugerem um importante ponto de tensão entre duas
organizações. Na divisão de competências, a diferenciação funcional conduziu historicamente a
especializações em tarefas específicas. A Polícia Civil autodescreve-se e realiza sua
auto-observação como organização que comunica por meio de decisões relacionadas à investigação
dos fatos. Na busca da verdade real, a verdade policial emerge como fase inicial, que permite
subsequentes decisões de outras organizações que participam na construção jurídico-penal dos
fatos.
Admitir-se que outras organizações concorrem na investigação supõe avaliação negativa sobre o
papel desempenhado pela organização policial. A produção de novos programas jurídicos
interaction: discourses on the police inquiry
Página 10
consubstanciados em legislações que tipificam novos delitos incrementa a possibilidade de atuação
das organizações. A definição das prioridades organizacionais depende não apenas da estrutura
hierárquica (organograma), mas também da cultura organizacional (premissa decisória).
4.3.2 Quem sabe investigar? Saber policial, saber jurídico e cultura organizacional
Os relatos dos promotores de justiça contrastam com a fala de delegados e de agentes de Polícia.
Os delegados ressentem das investidas do Ministério Público em um campo em que os promotores
não estariam treinados. A trajetória da Polícia é confrontada com a do Ministério Público. A polícia
sofreria do “mal da subserviência”, em alusão às constantes interferências políticas.
Já o Ministério Público teria investido no que é avaliado como estratégia equivocada: recrutamento
de jovens recém-egressos das universidades, sem suficiente amadurecimento para compreender a
investigação e as dificuldades enfrentadas pela Polícia (MISSE, 2010).
Na fala de um dos delegados de Polícia, o controle da investigação teria objetivo não explicitado,
porém evidente. O inquérito policial é fonte de poder:
“Delegado 2 - Mais eu vou dar um choque de realidade pra vocês dois que tão começando, mas nós
três aqui pensamos mais ou menos igual, depois de 10 anos e muita coisa que a gente viu (…). Mas
existe uma guerra mais ou menos aberta, por poder, não por interesse da sociedade, envolvendo
internamente na polícia agentes e outras classes, e delegados (…).”
4.3.3 O juiz e o inquérito policial
Nos relatos dos magistrados a investigação aparece como tema alheio à atividade judicial. Como já
mencionado, o modelo do juiz que conduz a investigação (juiz instrutor) foi adotado na França,
expandindo-se para outros países. Atualmente é questionado e reformado (MACHADO; GOMES
JÚNIOR, 2011a; MACHADO; GOMES JÚNIOR, 2011b). No Brasil, durante um longo período no
século XIX, as funções de investigação foram exercidas por um magistrado (juízes de paz)
(HOLLOWAY, 1997; SOUZA, 2003 e 2010). Nas falas, aparece de forma recorrente não apenas o
distanciamento da investigação, mas também as razões jurídicas que o justificam:
“Juiz 4: Eu acho que a gente não tem tanta proximidade, como ela falou, com inquérito pra que a
gente tenha esse controle ainda na fase de inquérito, porque a atividade jurisdicional ela é (…) o juiz
só age se provocado, então é preciso que depois que haja a violação, que chega a nosso
conhecimento por meio de provocação de alguém por meio de uma ação, por meio de uma outra
ação. Esse tipo de fiscalização fica mais a cargo dos promotores de justiça mesmo. Porque eles vão
fiscalizar a atividade policial investigativa (…)”.
4.4 Entre o mundo policial e o subsistema jurídico-penal: cultura organizacional e
comunicação
Há extensa pesquisa que aponta a discricionariedade das práticas policiais. A moldura normativa
constitui-se apenas o ponto de partida. As representações sociais sugerem o universo simbólico que
orienta as práticas (ARTHUR, 2010; MINGARDI, 1992; OLIVEIRA, 2003; WALKER, 1993).15
Pesquisas com outras organizações jurídicas também sugerem a importância da discricionariedade
para interpretação da cultura organizacional (MACHADO, 2011). As interações entre os membros de
distintas organizações policiais e jurídicas podem ser interpretadas pela diferenciação do subsistema
jurídico-penal. A cultura policial é condicionada por práticas e um saber específico, nem sempre
orientadas pela codificação jurídica. A leitura sistêmica da discricionariedade remete à existência de
sistemas concorrentes que motivam as práticas policiais. Nem sempre a codificação jurídica orienta
as decisões das organizações policiais (ANDERSEN, 2003, p. 151-182; LUHMANN, 2005a, p.
359-367; LUHMANN, 2010, p. 437-476; NOBLES; SCHIFF, 2001, p. 197-201).16
A acumulação dos saberes policiais, “dos tiras”, estabelece hierarquias e micropoderes na rede de
relações entre os atores que disputam o poder de nomeação da “verdade policial” (LIMA, 2003).17 Os
delegados de polícia reivindicam o papel de tornar inteligíveis (tradutor) os saberes policiais ao
mundo do direito, construindo discursivamente a necessidade de conectar o mundo da polícia ao
direito.
O promotor também surge como profissional especializado nesta divisão do trabalho de construção,
JUSTIÇA CRIMINAL, ORGANIZAÇÕES E SISTEMAS DE
INTERAÇÃO: DISCURSOS SOBRE O INQUÉRITO
POLICIAL Criminal justice, organizations and systems of
Página 11
ou reconstrução, da verdade. O profissional com expertise para levar a investigação ao Judiciário na
imagem simbolizada na metáfora do bastão. Nessa interseção, ou passagem de bastão, surgem os
conflitos e disputas. Compreensivelmente mais acentuadas que entre agentes de Polícia e
promotores de justiça. Nas interações organizacionais entre membros de diferentes organizações, a
concepção de campo surge como categoria que complementa a análise sistêmica. Dominar ou
pretender dominar o saber jurídico significa competir na nomeação jurídica dos fatos investigados no
campo jurídico-penal (BOURDIEU, 2001).
Em términos sistêmicos, a tradução da prática policial aos códigos do subsistema jurídico-penal abre
duas frentes de conflito. Entre agentes de Polícia e delegados de Polícia; entre delegados e
promotores. Os agentes criticam as dificuldades de acesso ao Judiciário para levar adiantes as
investigações. O trabalho cotidiano muitas vezes depende de decisões de outras organizações,
premissas decisórias para a comunicação da organização policial. Nas falas dos agentes aparecem
os aspectos pragmáticos da investigação policial, o modelo de enfrentamento com a criminalidade, a
eficácia na repressão do crime. Os delegados vivenciam o duplo pertencimento a estes dois mundos.
A atuação concreta do “delegado jurista” é representada depreciativamente, como um “defensor
público”, com discursos repletos de significados jurídicos, com preocupação com tendências
jurisprudenciais e dogmáticas. O delegado, por outro lado, valoriza exatamente a sua função de
mediador entre estes dois mundos. O sentido de eficiência na produção da verdade policial é
contrastado com tradução das informações aos códigos do subsistema jurídico-penal. A tradução do
saber do tira, consubstanciado em investigações concretas à codificação jurídica repercutiria na
aceitação do material probatório produzido pelas demais organizações do subsistema jurídico-penal.
As decisões da Polícia reduzem complexidade e ensejam novas decisões de outras organizações.18
Os processos de socialização organizacional e profissional e as pautas culturais são conformados
pela interpenetração entre sistemas psíquicos e sistemas sociais. As mensagens do subsistema
jurídico-penal também são importantes na construção das individualidades e subjetividades
(LUHMANN, 1990). A aceitação ou valor conferido às investigações associa-se à conformidade
jurídica das técnicas utilizadas. A comunicação jurídica valoriza o respeito a garantias individuais
(programa constitucional). A eficiência deveria ter como anteparo os direitos fundamentais.
4.5 Do inquérito ao arquivamento: o bastão com o promotor de justiça
Nos relatos dos magistrados, o primeiro passo aparece sob o comando do promotor de justiça. Um
dos entrevistados relata experiência de cidade satélite (Ceilândia). A pedido dos promotores de
justiça os inquéritos passaram a tramitar diretamente entre delegacias e Ministério Público,
agilizando os procedimentos. Aparecem os relatos de eventuais divergências, quando o juiz discorda
da interpretação do promotor e remete os autos ao procurador-geral de Justiça para revisão (art. 28
do CPP (LGL\1941\8)). Predomina, contudo, a confiança nas opções jurídicas do promotor. O
arquivamento é retratado como prosecutor’s business:
“Juiz 4 - Eu não tenho tempo nem de ler os pedidos de arquivamento. Pediu arquivamento eu
homologo, é, fazer uma sentença de homologação de arquivamento. Aí às vezes os promotores vêm
e falam assim ah, você viu que eu pedi um arquivamento dum processo, fiquei meio em dúvida.. falei
não vi, você pediu, eu arquivei (…).”
“Juiz 4 - É, não vou aplicar… tem um artigo que se o juiz entender, o promotor pediu arquivamento
mas eu entendo que é crime, eu mando pro procurador geral, pra ele oferecer denúncia, ou designar
um promotor.. eu não faço isso, não aplico (…).”
“Juiz 1 - Eu dificilmente faço isso (…).”
“Juiz 2 - Muito pelo contrário, você tem que confiar no profissional que trabalha com você.”
Os relatos são relevantes para a compreensão da comunicação das organizações que participam da
divisão do trabalho jurídico-penal. As decisões dos tribunais, forma de comunicação organizacional,
não prescinde de premissas decisórias. As imagens colhidas a partir dos sistemas de interação
(grupos focais) sugerem algumas pistas sobre divisão de competências jurídico-penais. A opção pelo
arquivamento da investigação pelo promotor de justiça surge como decisão que, em regra, não é
confrontada pelo magistrado.
interaction: discourses on the police inquiry
Página 12
4.6 Cultura e organização policial: interações organizacionais entre o delegado e o agente
Nos relatos dos agentes de Polícia, o papel do delegado de Polícia no modelo brasileiro vincula-se
às finalidades do inquérito policial, à teleologia da investigação: a produção da verdade. A verdade
policial, na análise de Lima (LIMA, 2003). Nas imagens sugeridas nas representações sociais podem
ser encontradas pistas sobre as interações organizacionais e premissas decisórias da organização
policial. Os relatos sugerem a existência de delegados operacionais e cartorários.
O delegado operacional é representado como figura pró-ativa, comprometida com os saberes
policiais e racionalidade instrumental do inquérito policial: a investigação. Já o delegado cartorário é
descrito na tipologia dos agentes como burocrata, muitas vezes perdido na teia construída de atos
oficiais, formalização de termos e procedimentos, com a pretensão de conferir caráter para-judicial
ao inquérito policial. Como um resquício formalista que remete ao modelo anterior, em que a
investigação era conduzida por um magistrado, que acumulava funções que apenas ao longo da
história foram repartidas a distintos funcionários do Estado.
Na avaliação dos agentes, o delegado, gestor da Delegacia de Polícia, deveria providenciar as
condições materiais e humanas para que o agente investigador, o profissional da investigação na
fala dos agentes, pudesse de fato desempenhar a sua função, a verdadeira “razão de ser” do
inquérito policial.
A leitura sobre o papel do delegado de Polícia surge nos relatos sobre a atividade diária na
delegacia. A formação jurídica não é desprezada. Ao contrário, teria função importante: atender
demandas da investigação segundo a lógica do Estado de Direito. Os agentes relatam a relevância
da interação com membros de outras organizações. Durante a investigação, muitas vezes, há
necessidade de medidas cautelares que dependem de autorização judicial, o que demanda
intervenção do delegado de Polícia, circunstância que valorizaria a formação jurídica do delegado.
Não raramente faz-se necessária a interação com promotores e magistrados, papel que os agentes
assumiriam nas rotinas da delegacia:
“Agente 2 - É, eu acho que o delegado ele exerce um papel fundamental na delegacia, ele, assim,
né, minha opinião, o delegado tem que atuar junto com as sessões (…).”
“Agente 2 - Eu conheço delegados que atuam realmente junto com as sessões. (…)”.
“Agente 1 - Que a gente chama delegados operacionais.”
“Agente 2 - Então, por exemplo, o chefe de sessão, ele vai lá, conversa, o delegado, doutor, olha, tão
precisando que o senhor faça uma requisição aí de uma escuta telefônica oh, o caso é esse, o
delegado ta ali, interagindo, sabe o caso, então você tem, vamos dizer assim, uma equipe coesa, né,
onde agentes e delegados trabalham, o delegado trabalha na investigação, ele não só disfarça, né,
(…).”
“Agente 4 - (…) Quem faz investigação é a gente (…), eu não to dizendo que o delegado não possa
participar, o Ministério Público tem até brigado pra poder ter esse direito também, creia-se até que
vai conseguir (…). Se o agente investigador precisa duma viatura, o chefe tem que correr atrás, tem
que tentar conseguir.”
Os agentes de Polícia ressentem do distanciamento com os delegados de Polícia. A hierarquia não é
discutida, e inclusive é ressaltada como importante para a corporação. Mas também revela certo
distanciamento. As barreiras simbólicas construídas pela distribuição de cargos segundo a
aproximação com o mundo do direito marcariam a diferença com o ethos policial.
“Agente 2 - Então agente vê às vezes vê um agente que tem, é, vou até usar a palavra medo, mas,
é, receio de chegar no delegado, pedir isso e achar que ele vai interpretar de uma outra maneira que
não (…)”.
“Agente 1 - Tem delegado também que já chega e fala não quero agente na minha sala. (…)
Agente 1 - Oh, na verdade, o delegado, ele se sente o rei.”
Entre os agentes de Polícia predomina a visão que valoriza a figura descrita (conceito nativo) como
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INTERAÇÃO: DISCURSOS SOBRE O INQUÉRITO
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delegado operacional. A definição associa-se à sintonia com os objetivos da investigação, com a
“atividade-fim”, a razão de ser do inquérito policial. O delegado cartorário aparece muitas vezes, na
fala dos agentes, como um antagonista, antes que um parceiro.
“Agente 1 - Na minha opinião, eu acho que todos os delegados, eu , na minha opinião, acho que
todos os delegados deveriam ser operacional sim, entendeu? Porque, porque tem situações que
agente tá na rua e fica em dúvida, vamo entrar, vamo num vamo, quando o delegado operacional ele
tá ele fala assim vamos e seja o que Deus quiser, eu arco com a consequência, você entendeu?
[…].”
Os delegados operacionais seriam raros, na visão dos agentes de Polícia. A formação profissional
focaria em trabalhos burocráticos do inquérito, fazendo com que ele tivesse pouco domínio das
técnicas de investigação, do know how acumulado na rua, saber “dos tiras”.
“Agente 2 - Dentre os delegados, você conta poucos operacionais, poucos delegados operacionais.”
“Agente 3 - São raros, mas é justificado porque o trabalho dele é despachar inquérito, é ficar
impondo inquérito, ele não tem uma experiência de rua, de investigação. Ele precisa de inquérito, de
presidir um inquérito (…).”
5. CONCLUSÕES
Certamente, as premissas decisórias são importantes para a compreensão da forma de
comunicação das organizações. As ações sociais perdem a centralidade na análise. Contudo, as
estruturas hierárquicas e os procedimentos por meio dos quais são recrutados os membros e
divididas as tarefas não perdem a relevância no modelo sistêmico (premissas decisórias).
A compreensão das decisões como comunicação organizacional pressupõe adensar o conhecimento
sobre a forma como as organizações se auto-observam e autodescrevem, bem como sobre as
premissas decisórias, como a distribuição dos papéis e tarefas (organograma), recrutamento dos
membros e interações organizacionais. Aprofundar o conhecimento da cultura organizacional
significa desvendar parte das premissas decisórias.
Na análise dos sistemas de interação, as pessoas mantêm um papel fundamental, já que a
comunicação é estruturada pela presença/ ausência. Por outro lado, a interpenetração entre
organizações e sistemas de interação permite novas possibilidades de pesquisa empírica, razão pela
qual se fala em interações organizacionais. Neste artigo, privilegiamos a análise das representações
sociais produzidas por meio de sistemas de interação (Grupos Focais).
Os mitos organizacionais não são incompatíveis com a proposta sistêmica. Na medida em que
conformam a cultura organizacional, são relevantes para a compreensão das premissas decisórias e
forma de comunicação das organizações. Os discursos dos profissionais da Polícia e do Direito,
membros de diferentes organizações, revelam mitos organizacionais. A chamada verdade real
parece permear grande parte das falas dos sujeitos da pesquisa.
Entre os magistrados, predomina visão crítica sobre a atuação da Polícia. Embora não haja voz
unânime, chega-se a propor a abolição da figura do delegado de Polícia, papel que deveria ser
ocupado pelo promotor de justiça. A prova técnica é valorizada como elemento de prova
fundamental. O magistrado deve-se manter afastado do conteúdo do inquérito policial, padrão de
comportamento que é descrito como tendência contemporânea das reformas processuais penais.
Valoriza-se a análise inicial do promotor de justiça em relação ao resultado do inquérito policial. Em
regra, não há divergência quanto aos arquivamentos requeridos pelos promotores. Analisando sob o
enfoque sistêmico, a decisão do Ministério Público reduz complexidade para decisões de outra
organização. Ao mesmo tempo, comunica a existência de alternativa.
Entre os promotores de justiça, predomina o ceticismo no papel cumprido pelo delegado de Polícia.
O relatório final, peça que culmina a investigação, é descrito como documento que, em regra, não
ajuda e muitas vezes atrapa-lha o promotor. A análise jurídica e o enquadramento do suposto tipo
penal gerariam dificuldades dificilmente contornáveis durante a instrução. Os promotores de justiça
reivindicam atuação mais relevante na fase do inquérito e defendem que apenas assim os delitos
não tradicionais, como os crimes de colarinho branco poderiam ser devidamente investigados.
interaction: discourses on the police inquiry
Página 14
Em um ponto a fala dos promotores encontra eco no discurso dos juízes: a falta de autonomia da
Polícia impediria investigações sensíveis para o poder local. As interferências políticas
enfraqueceriam a atuação isenta da polícia.
O discurso dos delegados de Polícia valoriza o papel de um profissional da área jurídica que conduz
o inquérito policial. A referida “advogadização” é construída internamente como elemento peculiar do
modelo brasileiro que não deveria ser modificado. Ao contrário, seria a tradição da investigação no
Brasil. As críticas são dirigidas fundamentalmente aos promotores de justiça, que pouco ou nada
compreenderiam das investigações. O saber especializado do Delegado de Polícia estaria
exatamente na conexão entre a expertise policial e a formação técnica do jurista. A profissão do
Delegado de Polícia constituiria, assim, em forma de acoplamento estrutural entre o mundo policial e
o mundo do direito.
Entre os agentes de Polícia predomina o discurso de autovalorização do trabalho policial. A função
precípua do inquérito, a investigação, configuraria um campo complexo para quem domina o saber
“dos tiras”.
O trabalho do agente apareceria na denúncia do promotor, na imagem retórica do “espelho da
denúncia”. Os relatórios detalhados dos agentes de Polícia forneceriam os subsídios fundamentais
para a ação penal. Além disso, na prática, os agentes cumpririam o papel de convencimento do
promotor e juiz da linha da investigação, bem como da necessidade de medidas cautelares. A
imagem dos delegados de Polícia aparece associada à razão de existir do inquérito: investigação. O
delegado operacional é descrito como profissional dedicado à investigação. Antes de um jurista, fala
como policial, que apoia material e juridicamente a “apuração dos fatos”. O delegado cartorial
aparece como profissional que se perderia nos meandros da burocracia, orientado pela codificação
jurídica. No afã de conferir juridicidade aos atos de investigação, perderia o foco principal da
atividade da Polícia Judiciária.
79. INTRODUÇÃO
Este artigo apresenta duas abordagens
sobre o controvertido conceito de ordem
pública no âmbito do sistema de justiça
criminal brasileiro. A atenção está concentrada
em dois momentos privilegiados do funcionamento
desse sistema: no primeiro, estudam-
se as decretações de prisões preventivas
com fundamento da garantia da ordem pública;
no segundo, procura-se desvendar sua
utilização no âmbito da segurança urbana nas
últimas décadas. A primeira parte do estudo
resulta da análise do discurso de 460 decisões
judiciais da Suprema Corte no período compreendido
entre 1930 e 2013. A segunda parte
diz respeito ao contexto político criminal
em que a segurança urbana ganha força e traz
consigo o conceito de ordem pública, com
novos usos, alguma concretude, mas nada
distante dos antigos significados políticos que
informam as decisões judiciais. O marco temporal
desta segunda abordagem, no Brasil, é
o período que sucede à Constituição Federal
de 1988, tanto pela referência importante
que é na política e no direito brasileiro, mas
também pelas mudanças que ocorreram em
outros países nesta época, que continuam a
impactar na forma com que se percebe a segurança
e a ordem pública.
O conceito de ordem pública surge normalmente
associado ao exercício do poder no
âmbito dos Estados Nacionais, mas é eivado
de ambiguidades, pois em muitas ocasiões está
atrelado ao “acautelamento” do meio social,
outras vezes diz respeito ao clamor público,
noutras está vinculado a considerações sobre a
gravidade do crime, ou à segurança do ofendido
e, na visão de Gabriel Bentin de Almeida,
exatamente por isso esse conceito traz insegurança
jurídica (ALMEIDA, 2003).
Interesse público e bem comum são duas
referências constantes em tentativas de se definir
o que é ordem pública; também são frequentes
as menções à convivência harmoniosa
e pacífica. Trata-se, pois, de um conceito com
conteúdo indeterminado, que se tenta explicar
a partir de outros, igualmente indeterminados,
e que, portanto, só são passíveis de explicitação
pela observação de práticas políticas. Portanto,
O que é ordem pública no sistema de justiça criminal brasileiro?
Cristina Maria Zackseski e Patrick Mariano Gomes
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para que se entenda o que realmente significa,
os resultados de tais ações devem ser observados,
quer dizer, a forma com que os distúrbios
da ordem são controlados e quais as consequências
dessas ações para a democracia e para
a estabilidade das instituições, pois também
é muito comum que as instituições, especialmente
as polícias, sofram os efeitos da falta de
confiança da população.
É evidente a associação entre polícia e ordem
pública. Esta associação está expressa em
declarações de inspiração weberiana como a
que segue: “A necessidade de criar instituições
asseguradoras da ordem pública nasceu com o
Estado moderno que estabeleceu o monopólio
legítimo da força viabilizado pela polícia”
(STEINBERGER; CARDOSO, 2005, p. 97).
Esse entendimento corrobora a lógica da organização
das Secretarias Estaduais de Segurança
Pública brasileiras, cujas competências são: a)
executar a política governamental para preservação
da ordem pública e do patrimônio; b)
manter e garantir os direitos dos cidadãos; c)
desenvolver planos estaduais de segurança pública;
d) fortalecer as instituições públicas estaduais
e municipais; e) qualificar os agentes de
segurança pública (BRASIL, 2005).
Nesta esteira, Jorge Zaverucha apresenta o
conceito de ordem pública utilizado no Regulamento
para as Polícias Militares e Corpos de
Bombeiros Militares (Decreto 88.777), que é
de 1983 e segundo ele continua em vigor:
[...] conjunto de regras formais, que emanam
do ordenamento jurídico da Nação, tendo
por escopo regular as relações sociais de todos
os níveis, de interesse público, estabelecendo
um clima de convivência harmoniosa
e pacífica, fiscalizado pelo Poder de Polícia, e
constituindo uma situação ou condição que
conduza ao bem comum. (ZAVERUCHA,
2005, p. 151).
No Brasil, esta imprecisão interfere na rotina
de funcionamento do sistema penal, uma vez
que o Código de Processo Penal Brasileiro, em
seu artigo 312, inclui, entre os casos em que o
juiz pode decretar a prisão preventiva, a garantia
da ordem pública. Ele possui a seguinte redação:
“A prisão preventiva poderá ser decretada
como garantia da ordem pública, da ordem econômica,
por conveniência da instrução criminal,
ou para assegurar a aplicação da lei penal,
quando houver prova da existência do crime e
indício suficiente de autoria”. A expressão “garantia
da ordem pública” não tem significado
exato e é uma das inúmeras situações nas quais
a lei é vaga e imprecisa. A dificuldade em esclarecer
com precisão tais significados pode
corresponder, no caso específico da “garantia
da ordem pública”, ao que não pode ser dito,
pois ao dizê-lo o legislador ou o intérprete da
lei poderia contrariar outros dispositivos legais,
direitos fundamentais e princípios constitucionais
penais expressos (em sua grande maioria)
no artigo 5º da Constituição Federal de 1988.
No âmbito da política criminal, algumas
distinções básicas podem ser feitas. Na perspectiva
eficientista, a ordem pública significa a
ausência da ocorrência de crimes (e atualmente
de distúrbios da ordem e incivilidades), dependente
de uma política criminal repressiva,
que seria necessária para a coesão social em
torno das regras e mesmo para a existência do
Estado. Na perspectiva garantista, a situação é
outra, ou seja: na medida em que há particiO
que é ordem pública no sistema de justiça criminal brasileiro?
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pação social na elaboração e na aplicação das
regras, contribui-se para uma noção de ordem
pública que não esteja afeta à chamada razão
de Estado, e sim mais próxima do sentido
democrático de participação nas decisões, tal
como está expresso o ideal democrático nos
documentos produzidos por organismos internacionais
que se ocupam do problema da
insegurança urbana e da prevenção dos conflitos
na contemporaneidade1.
Portanto, numa análise preliminar, do ponto
de vista do Estado e no discurso jurídico
modernos, ordem pública significa respeito à
lei e funcionamento regular das instituições de
controle. Nas políticas criminais atuais, significa
a manutenção do controle sobre aquilo que
as pessoas percebem como distúrbio no funcionamento
das instituições que devem agir
em seu favor. No campo específico das políticas
de segurança observa-se que o conceito
de ordem pública que orienta as políticas de
segurança no Brasil desempenha uma função
deslegitimadora do discurso dos direitos humanos
e da participação cidadã, uma vez que
a guerra contra o crime adquire maior relevância
política se comparada às ações dos governos
locais destinadas à inclusão dos habitantes
das cidades e ao incentivo a comportamentos
conforme a lei. Isso será tratado no desenvolvimento
deste artigo, com o aprofundamento e
ilustração de tais observações preliminares.
A ORDEM PÚBLICA NOS PROCEDIMENTOS
JUDICIAIS – O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Na segunda metade dos anos 1930, a relação
entre ordem pública e cárcere começou
a compor a jurisprudência da Corte Suprema.
O conturbado período histórico do primeiro
governo de Getúlio Vargas até o ano de 1937,
quando Estado Novo foi constituído, foi marcado
pelo “perigo” do comunismo.
Em 22 de junho de 1936, o STF negou
provimento ao Recurso Criminal nº 919, impetrado
por Antônio Laredo Reis e outros, assim
ementado: “Lei de Segurança. Bombas de dynamite
destinadas a subversão da ordem pública; a
sua apreensão, e a subsequente confissão de um
dos acusados, autoriza a condenação”. O inquérito,
aberto por determinação do Chefe de Polícia
de Manaus (AM), visava apurar a responsabilidade
dos promotores de uma conjuração
para subverter a ordem pública naquela capital
e atentar contra as autoridades legitimamente
constituídas. O julgamento do suposto plano
de implantação de regime comunista no Estado
do Amazonas, por meio da explosão de prédios
públicos e com auxílio de cidadãos colombianos
e seringalistas desempregados, foi o primeiro
caso em que ordem pública e prisão preventiva
se tornaram objeto de análise do Supremo.
A única definição sobre o conceito de ordem
pública no STF durante esse período veio
no voto do ministro Bento de Faria, em sede
do habeas corpus nº 28.383, julgado em 25 de
fevereiro de 1943:
O conceito de – ordem pública – é amplo, e
nele se compreende não só a segurança política
como também a jurisdição, para não permitir
a ninguém o poder de ameaçar, quer a
existência e a finalidade das instituições, quer
o sistema jurídico, a paz pública e os princípios
da moral que governam a sociedade.
As constantes declarações de estado de
emergência fizeram com que a Suprema Corte
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se eximisse de julgar as ordens de habeas corpus
que se apresentavam, não questionando a
orientação política vigente, e o aparato legislativo
repressivo aos comunistas, levado a efeito
pelo ministro da justiça, Vicente Raó, acabou
por direcionar grande parte dos processos de
cunho político ao Tribunal de Segurança Nacional.
O etiquetamento ou a atribuição do status
de criminoso a inimigos políticos foi a tônica
desse período. A ação contra os comunistas
se deu tanto na criminalização primária (produção
de leis), como na criminalização secundária
(aplicação da lei penal). O que se exigiu
para concretização deste último foi uma ação
de centralização e fortalecimento da polícia e,
para o primeiro, a elaboração de leis e decretos
que deram o substrato para a ação repressiva.
Todos os acórdãos do STF do período
1936-1945 que fazem menção à ordem pública
se referem a crimes de natureza política,
sendo assim considerados aqueles contra o Estado,
contra a Lei de Segurança Nacional ou
em razão de defender ideias políticas contrárias
ao regime. Na busca realizada na base de dados
construída para a pesquisa não se localizou
qualquer decisão relacionada a crimes comuns.
Do criminoso político ao criminoso
comum – 1945-1974
A Constituição de 1946 anuncia no preâmbulo
um regime de tendência democrática
e sua elaboração se deu em um contexto político
menos conturbado e contou, inclusive,
com a participação de parlamentares do Partido
Comunista. Não sem razão, portanto, que
os acórdãos analisados que são posteriores ao
fim do Estado Novo, em 1945, indicam uma
diminuição nas perseguições aos comunistas.
A Apelação nº 1.439/SP tratou da marcação
de um comício de caráter subversivo na
cidade de Santos, em 30 de setembro de 1949,
sem prévia comunicação à polícia. Uma vez
proibido o comício pelas autoridades locais,
policiais e participantes entraram em confronto,
ocorrendo a morte de um investigador e
um “comunista” (conforme a decisão judicial).
A decisão veio assim ementada:
A lei 431 não foi revogada pela Constituição.
Não é crime ser comunista, mas se este, através
de partido ou associação exerce atividade
contrária à segurança do Estado ou à ordem
pública e social, estará sujeito às penas do art.
3 nº 8 da lei 431.
Toda a estrutura repressiva fortalecida no
Estado Novo não ruiria, obviamente, da noite
para o dia com o fim do regime político autoritário.
Grande parte do aparato legislativo
repressivo penal brasileiro continuou a existir,
mesmo com a derrocada dos regimes autoritários
que o instituíram.
No habeas corpus nº 31.688/SP, julgado em
22 de agosto de 1951, sendo relator o ministro
Nelson Hungria, fica evidente que a polícia
continuou tendo liberdade de atuação, mesmo
após o fim do Estado Novo:
Fatos perturbadores ou ameaçadores da perturbação
da ordem pública. Competência da
autoridade policial. Independentemente de
inquérito policial, pode a autoridade, na função
de polícia preventiva, mandar vir a sua
presença, para esclarecimento de fatos perturbadores
ou ameaçadores de perturbação
da ordem pública, as pessoas neles envolvidas.
A intimação para tal fim independe de
mandado formal.
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No entanto, já se nota alguma tentativa
de controle da atividade policial nos anos
subsequentes. É o que se vê no habeas corpus
nº 33.610/SE, de 22 de junho de 1955, cuja
paciente era uma dona de casa do interior do
Estado de Sergipe, presa pelas seguintes razões:
Adianta que a prisão foi ditada pelo acúmulo
de queixas contra a beneficianda, “mulher
solteira e sem honra no sentido de virgindade.”
[...] Acrescenta que o seu procedimento
é muito sujo na cidade e na polícia, por se
tratar de pessoa linguaruda e fuxiqueira...
A decisão do Supremo, neste julgamento,
dá uma resposta ao arbítrio policial:
Não é lícito à autoridade policial atribuir-se
o direito de, ao seu alvedrio, mandar deter
e prender as pessoas, fora dos casos previstos
na lei. Na missão de velar pela ordem e tranquilidade
públicas não se inclui a faculdade
de enclausurar os cidadãos, salvo em flagrante
delito ou mediante ordem escrita de quem
competente. O prestígio da autoridade deflui
do respeito, por parte dela, dos mandamentos
constitucionais e legais, da serenidade e
legitimidade de seus atos.
O regime democrático, instaurado com a
Constituição de 1946, mantém-se até 1964,
quando os militares instalam-se no poder. O
início do período ditatorial, do ponto de vista
legislativo, é marcado pela edição de 17 Atos
Institucionais (AI). Os primeiros cassaram
mandatos, suspenderam direitos conquistados
e extinguiram partidos políticos.
O preâmbulo do Ato Institucional nº 5, de
13 de dezembro de 1968, já anuncia a busca de
inimigos e, novamente, em nome da ordem:
CONSIDERANDO que, assim, se torna
imperiosa a adoção de medidas que impeçam
sejam frustrados os ideais superiores da Revolução,
preservando a ordem, a segurança, a
tranquilidade, o desenvolvimento econômico
e cultural e a harmonia política e social do
País comprometidos por processos subversivos
e de guerra revolucionária;
CONSIDERANDO que todos esses fatos
perturbadores da ordem são contrários aos
ideais e à consolidação do Movimento de
março de 1964, obrigando os que por ele
se responsabilizaram e juraram defendê-lo,
a adotarem as providências necessárias, que
evitem sua destruição.
O AI nº 5 deu poderes ao Presidente da República
para fechar o Congresso Nacional e,
em seu art. 10, suspendeu a garantia de habeas
corpus nos casos de crimes políticos contra a
segurança nacional, a ordem econômica e social
e a economia popular. Em 16 de janeiro de
1969, os ministros do Supremo Tribunal Federal
Evandro Lins e Silva, Hermes Lima e Victor
Nunes Leal foram aposentados pelo regime
militar com amparo no referido Ato.
Não foram localizadas muitas decisões do STF
do período 1945-1974 que versam sobre o tema
da ordem pública e prisão preventiva. No entanto,
ao fim desse período encontra-se o primeiro acórdão
relativo à prática de crime comum.
O repertório de 33 anos de jurisprudência
do STF sobre ordem pública e prisão preventiva,
contados da entrada em vigor do novo Código
de Processo Penal (CPP), é constituído exclusivamente
por crimes políticos. Demonstrou-se,
assim, que a formação do conceito da ordem
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pública e sua relação com o cárcere se deu antes
mesmo da previsão legislativa de 1941, e serviu
como substrato de construção de uma tentativa
de racionalidade no discurso jurídico-penal para
justificar a perseguição aos inimigos do poder
instituído, mesmo que para tanto bastasse somente
a diferença no campo das ideias.
Da entrada em vigência do atual CPP até
o ano de 1974 o instituto se manteve fiel aos
propósitos de sua criação, restringindo-se ao
papel de importante instrumento político de
estigmatização, isolamento e, porque não, aniquilação
daqueles que ousassem discordar dos
que detinham o poder.
O habeas corpus nº 52.697/RJ, julgado em
13 de setembro de 1974, foi o primeiro a mencionar
a ordem pública para justificar o encarceramento
provisório por crime comum. Os
pacientes foram acusados de integrar quadrilha
especializada em furtos de veículos.
A tentati va de construção de uma nova
racionalidade do discurso jurídico -
penal para justificar o aprisionamento
cautelar – 1974 at é os dias atuais
Como não se revisou a legislação de cunho
autoritário, base das leis penais elaboradas durante
o Estado Novo, a possibilidade legal de
determinar a prisão de um cidadão ou cidadã
com a justificativa de perigo ou risco à ordem
pública acabou servindo para outros propósitos.
A década de 1990, para o campo penal brasileiro,
é marcada, sob a ótica legislativa, pela
entrada em vigor da Lei nº 8.072/90, que ficou
conhecida como dos Crimes Hediondos, e da Lei
nº 9.034, de 3 de maio de 1995, a Lei das Organizações
Criminosas. Já nos anos 2000, o maior
impacto legislativo de recrudescimento penal foi,
sem dúvida, a entrada em vigor da nova Lei de
Drogas, Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.
É neste contexto de endurecimento da legislação
penal que a jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal passa a ser mais abundante no tema da
ordem pública e prisão cautelar.
Com acentuada influência da legislação
estrangeira autoritária, a entrada em vigor da
Lei nº 9.034, de 3 de maio de 1995, instituiu
no País um novo inimigo: o “crime organizado”.
Combatê-lo virou palavra de ordem em
qualquer discurso político, tanto da esquerda
quanto da direita (KARAM, 1996).
Com relação às organizações criminosas
pode-se citar o habeas corpus nº 102.164/RJ:
Decreto de prisão preventiva devidamente
fundamentado na garantia da ordem
pública, considerada a participação do
Paciente em organização criminosa, notadamente
o exercício de chefia, e a possibilidade
objetiva de reiteração delituosa,
que não é desmentida pelos elementos
constantes nos autos.
As organizações criminosas passam a compor o
discurso jurídico-penal com a entrada em vigor da
lei em maio de 1995, o que indica que a partir de
então os atores jurídicos tiveram que buscar o que
seria organização criminosa e quem a compunha.
A atual lei de drogas, por sua vez, constitui
marco relevante para a construção de um
discurso jurídico-penal que eleva à categoria
de inimigo interno a figura do traficante. Para
Vera Regina Pereira de Andrade:
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Trata-se de uma Política de guerra, combate
ou beligerância (genocida) que, inserida
num processo de transnacionalização ou
globalização do controle social – é potencializada,
no Brasil, por uma tríplice base
ideológica: a ideologia da defesa social (em
nível dogmático) complementada pela ideologia
da segurança nacional (em nível de
Segurança Pública), ambas as ideologias em
sentido negativo instrumentalizadas (no nível
legislativo) pelos Movimentos de Lei e
Ordem (com sua ideologia em sentido positivo).
(ANDRADE, 2013, p. 2-3)
Dessa forma, ao analisar os procedimentos
judiciais no STF relativos à prisão preventiva
para garantia da ordem pública, foi possível
perceber que os inimigos da ordem são aqueles
que o poder político punitivo assim determina
e opta por selecionar durante determinado período
ou processo histórico.
O MARCO LEGAL DA SEGURANÇA E DA
ORDEM PÚBLICA NA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988
A Constituição brasileira de 1988 é um marco
importante na história do País, tanto do ponto
de vista jurídico como do político e social.
Ela é o símbolo formal da redemocratização
brasileira, que se iniciou em 1985, e neste texto
é o ponto de partida para a análise da construção
do conceito de ordem pública nas políticas
de segurança. Este diploma legal contém várias
menções à ordem pública, sendo que algumas
delas carregam consigo flagrantes contradições
ou ambiguidades que são reveladoras das peculiaridades
deste conceito, e que indicam um caminho
para observar modificações também em
outros documentos e discursos.
De acordo com informações divulgadas
outrora pelo governo brasileiro (BRASIL,
2005), o “aumento da criminalidade e da
violência” tem origens na década de 1960 e
principalmente 1970, quando o país atravessou
um processo acelerado de urbanização e
de crescimento de grandes centros urbanos e
regiões metropolitanas, sob um regime autoritário
e excludente.
Segundo José Murilo de Carvalho, na época
da promulgação da Constituição de 1988
pensava-se que: “[...] o fato de termos reconquistado
o direito de eleger nossos prefeitos,
governadores e presidente da República seria
garantia de liberdade, de participação, de segurança,
de desenvolvimento, de emprego,
de justiça social” (CARVALHO, 2001, p. 7).
Contudo, o mesmo autor diz que o exercício
de direitos, como a liberdade de pensamento
e o voto, não é suficiente para a garantia de
outros “direitos”, como o emprego e a segurança,
ou seja, que o exercício de direitos civis
e políticos não se relacionam, direta e imediatamente,
com direitos sociais.
A Constituição Federal de 1988 classifica
a segurança como um direito social. É dedicado
também a este assunto um capítulo intitulado
“Da Segurança Pública”. Neste capítulo
estabelece-se o sistema de segurança pública,
com seus órgãos e funções (art. 144, incisos
I a V), sendo este sistema encarregado da: a)
preservação da ordem pública; b) preservação
da incolumidade das pessoas e do patrimônio.
O direito à segurança é geralmente situado
entre os direitos individuais. Na Constituição
federal brasileira de 1988 a seguO
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rança aparece, inicialmente, no preâmbulo
e depois, no Título II, referente aos direitos
e garantias fundamentais. Ela é mencionada
tanto na redação do caput do artigo 5º – Dos
Direitos e Deveres Individuais e Coletivos –
como no caput do artigo 6º – Dos Direitos
Sociais. No entanto, configurar a segurança
como um direito constitucionalmente protegido
não significa que serão atendidos padrões
mínimos de proteção igualitária. Nesse
sentido, Theodomiro Dias Neto faz uma
observação sobre o direito à segurança que
precisa ser considerada:
A doutrina constitucional alemã – tradicionalmente
orientada à ideia do Estado como
centro único do poder, da política e do direito
– passou a legitimar restrições às garantias
individuais com base em um “direito
fundamental à segurança” (Isensee, 1983), a
ser protegido pelo Estado por intermédio do
aparato penal. Ferrajoli (1978) diagnostica a
deturpação da noção de garantismo, que de
sistema de garantias da segurança do cidadão
contra o arbítrio estatal converte-se em
sistema de garantias de segurança do Estado.
(DIAS NETO, 2005, p. 93).
Então a segurança não dependeria apenas
dos direitos individuais, e sim de todos os direitos
fundamentais, ainda que as políticas atuais
destinadas a melhorar as condições de segurança
das populações urbanas estejam sendo
desenvolvidas pelas administrações locais que,
em geral, têm suas competências mais fortemente
relacionadas aos direitos sociais, econômicos
e culturais. Somam-se, aí, o direito
ao meio ambiente, cuja gestão também está a
cargo dos governos locais e que também possui
uma interface com a política global.
Esta relação local-global se reflete nas políticas
públicas contemporâneas. A construção
da cidadania, por exemplo, para José Murilo
de Carvalho, “[...] tem a ver com a relação das
pessoas com o Estado e com a nação”, pois as
pessoas se tornavam cidadãs “[...] à medida
que passavam a se sentir parte de uma nação
e de um Estado, ao passo que hoje existe um
consenso em torno da ideia de que vivemos
uma crise do Estado-nação” (CARVALHO,
2001, p. 12). Contudo, para este estudo sobre
as modificações na segurança que estão implicadas
nesta crise do Estado-nação importa a
afirmação seguinte do autor:
A redução do poder do Estado afeta a natureza
dos antigos direitos, sobretudo políticos e sociais.
Se os direitos políticos significam participação
no governo, uma diminuição no poder
do governo reduz também a relevância do direito
de participar. Por outro lado, a ampliação
da competição internacional coloca pressão sobre
o custo da mão de obra e sobre as finanças
estatais, o que acaba afetando o emprego e os
gastos do governo, do qual dependem os direitos
sociais. (CARVALHO, 2001, p. 13)
Além dessa necessária e complexa equação
que envolve diversos direitos e garantias
fundamentais há uma preocupação específica
quanto ao lugar e ao desenho constitucional da
segurança, e um dos problemas mais flagrantes
compreende o controle militarizado sobre a
ordem pública, pois segundo Jorge Zaverucha:
A nova Constituição descentralizou poderes
e estipulou importantes benefícios sociais similares
às democracias mais avançadas. No
entanto, uma parte da Constituição permaneceu
praticamente idêntica à Constituição
autoritária de 1967 e sua emenda de 1969.
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Refiro-me às cláusulas relacionadas com as
forças armadas, polícias militares estaduais,
sistema judiciário militar e de segurança pública
em geral. (ZAVERUCHA, 2005, p. 59)
Pode-se dizer, portanto, que no Brasil o
controle militar sobre a ordem pública permanece.
Ele pode ser observado tanto na legislação
quanto em documentos de governo, sendo
que esta opção está sempre justificada pela iminência
de perigos que, no mais das vezes, são
definidos arbitrariamente.
A ORDEM PÚBLICA NAS POLÍTICAS
URBANAS DE SEGURANÇA
Assim como na jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal analisada anteriormente, nas
políticas de segurança o conceito de ordem pública
também assume configurações distintas a
depender da configuração política, das diversas
possibilidades de construção da ideia de inimigo,
e dos objetivos sociais manifestos culturalmente
e planetariamente. A proposta, nesta
etapa, é discutir o conceito de ordem pública
a partir das dinâmicas do contexto urbano e
das formulações políticas voltadas a padrões
conhecidos hoje como de “qualidade de vida”,
pois este conceito está afeto ao tema da segurança,
que já foi nacional, passou a ser pública
e se transformou em urbana durante o transcurso
do século XX.
O conceito de ordem pública é reeditado na
medida em que as cidades assumem um papel
relevante na administração dos problemas de
segurança, e é nessa reedição do conceito que se
centra o interesse deste estudo, por se considerar
que assim ele está mais próximo do que nunca
esteve de assumir um significado concreto.
Segurança, ordem, igualdade, participação,
segregação
Um problema não resolvido das políticas
de segurança contemporâneas consiste no
acesso diferenciado a esse bem público, dadas
as situações de exclusão, ou seja, de não pertencimento
a uma comunidade determinada. Philippe
Robert, para referir-se àqueles que a literatura
sociológica e criminológica atual refere
como ‘excluídos’ (outsiders), utiliza o termo desarraigados
(‘desgarrados’), definindo-os como
“[...] aquellos que no participan de los vínculos
de pertenencia a una comunidad” (ROBERT,
2003, p. 40). São, portanto, os “outros” da psicanálise,
os “estranhos” da política urbana, os
“imigrantes” da política internacional, os “suspeitos”
do sistema penal, os “não civilizados”
das políticas de segurança urbana. A definição
trazida pelo autor, apesar de dizer respeito ao
caso francês em particular, é relevante para este
trabalho uma vez que serve de guia para a análise
das dinâmicas excludentes da atualidade,
concentradas nos desejos de segurança das populações
urbanas, pois as políticas atuais neste
ramo ressuscitam a comunidade como ente capaz
de realizar este desejo, em alguma medida,
mas em geral elas só abrangem os incluídos.
A participação comunitária surge como a
nova panaceia para o problema da segurança e
como alternativa ao modelo repressivo de política
nesta área, mas os pressupostos que informam
esta alternativa, no mais das vezes, são os
mesmos que informam as políticas das quais
pretendem diferenciar-se: a pobreza como causa
do crime, o grande problema que representam
os pequenos delitos ou as incivilidades, a incapacidade
dos governos democráticos de controlar
a delinquência, a segurança como indicador
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de qualidade de vida, etc. São comuns em textos
acadêmicos e relatórios de governo afirmações
genéricas como as que seguem: “[...] hay una
relación positiva entre la participación ciudadana
y el control efectivo de la criminalidad; su
papel en la prevención del delito es crucial. Los
ciudadanos pueden ayudar a disminuir el delito
o permitir que se convierta en un estilo de vida.”
(PÉREZ GARCÍA, 2004, p. 33)
Policiamento e Comunidade
A segurança comunitária geralmente funciona
a partir de redes de informações e relações
entre os habitantes de um determinado
bairro, que utilizam mecanismos como o Neighbourhood
Watch, ou grupos privados de autodefesa,
ou também a partir do envolvimento
da polícia com os cidadãos nas estratégias
conhecidas como Policiamento Comunitário.
Sabe-se, porém, que algumas estratégias nesse
sentido surtiram ou surtem efeito sobre as incivilidades,
e assim mesmo quando utilizadas
em bairros compostos de cidadãos fortemente
articulados, ou com níveis elevados de capital
social. Segundo Theodomiro Dias Neto:
Estudos sobre a composição das organizações
comunitárias costumam destacar uma maior
incidência de indivíduos casados, proprietários,
com maior tempo de residência na área e em
melhor situação econômica e educacional. Uma
avaliação da Police Fondation sobre um projeto
de organização comunitária promovido pela
polícia de Houston indicou um maior êxito do
programa entre brancos e proprietários. Uma
das explicações para esta disparidade seria a tendência
da polícia em limitar seus contatos com
os grupos já estabelecidos, ao invés de investir
na comunicação com segmentos não-organizados.
Tal situação pode aguçar as divisões sociais,
com os segmentos mais influentes, em maiores
condições de articular publicamente as suas demandas,
assumindo o controle da agenda e dos
recursos policiais. (DIAS NETO, 2000, p. 97).
Outra ressalva importante a este tipo de estratégia
de segurança é a sua vocação simbólica,
quer dizer, ela foi desenvolvida para que o envolvimento
de comunidades nas questões de segurança
representasse uma mudança na percepção
e na avaliação que fazem da atividade policial.
Isso significa que a estratégia de policiamento
comunitário é muito mais uma resposta simbólica
ao problema da insegurança e da desordem
do que uma estratégia real, capaz de modificar
a segurança objetiva das populações urbanas. A
estratégia de segurança que tenha como foco
o policiamento comunitário envolve, no mais
das vezes, os elementos que aqui se discutem: 1.
necessidade de prevenção dos conflitos; 2. participação
da comunidade; 3. controle das desordens
(ROSEMBAUN, 2002).
Mas, afinal, de quem é a segurança provida
pela iniciativa comunitária? Contra quem ou que
tipo de risco? Não seria este um exemplo da segurança
como “razão de Estado” na administração
das cidades, em vez da tão falada “segurança
cidadã”? Paradoxalmente, não seria a segurança
cidadã (geralmente relacionada ao policiamento
comunitário e a iniciativas similares) mais fortemente
identificada com a segurança dos condomínios
artificiais de classes médias e altas, que
nada tem a ver com redes comunitárias?
Nos bairros ricos, a segurança é, em grande
parte, privada e nos bairros pobres as pessoas
têm outras necessidades. Muitas vezes elas mesmas
são percebidas como perigosas, portanto,
O que é ordem pública no sistema de justiça criminal brasileiro?
Cristina Maria Zackseski e Patrick Mariano Gomes
Rev. bras. segur. pública | São Paulo v. 10, n. 1, 108-125, Fev/Mar 2016 119
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não estão em condições de se preocuparem com
suas condições de segurança de acordo com os
padrões dos grupos incluídos, no sentido convencional
de proteção contra o risco criminal
comum, ou não conseguem expressá-las de forma
que alcancem o nível da formulação de políticas.
Este problema é particularmente relevante
para a realidade brasileira, pois no final da década
de 1980 a população urbana no Brasil já era
de 111.867.000 pessoas, entre as quais 33,2%
eram pobres urbanos (SERRA, 1998).
Além do problema da pobreza, há que se
considerar também a segmentação, pois a distância
social, inclusive em termos de localização
espacial na cidade – segregação – e qualidade
das moradias, reduz a possibilidade de interação
social entre grupos distintos (SUNKEL,
2003, p. 311). Quanto menor for este contato,
maior a probabilidade de os comportamentos
dos “estranhos” serem considerados negativos.
Nesse sentido, são importantes as observações
de Luiz Cezar de Queiroz Ribeiro, pois para ele
“[...] a segregação espacial assume o papel de
reprodutora das desigualdades no que respeita
à distribuição do poder social na sociedade,
entendido este como a capacidade diferenciada
dos grupos e classes em desencadear ações que
lhes permitam disputar recursos urbanos” (RIBEIRO,
2004, p. 27).
Jane Jacobs dedica um capítulo inteiro de
seu livro Morte e vida de grandes cidades aos
usos dos bairros e toca num dos fundamentos
das atuais políticas de segurança urbana, tanto
norte-americanas quanto europeias, que é
a noção de ordem (limpeza, silêncio, iluminação)
no ambiente urbano e sua relação com a
segurança contra o risco criminal:
Está na moda supor que certos referenciais
de uma vida digna conseguem criar bairros
dignos – escolas, parques, moradias limpas e
coisas do gênero. Como a vida seria fácil se
fosse verdade! Que maravilha satisfazer uma
sociedade complexa e exigente dando-lhe singelas
guloseimas concretas! Na prática, causa
e efeito não são assim tão singelos. Tanto que
um estudo feito em Pittsburgh, com o intuito
de demonstrar a suposta íntima correlação entre
moradias melhores e condições sociais mais
altas, comparou os índices de delinquência em
cortiços com aqueles em novos conjuntos habitacionais
e chegou à embaraçosa conclusão
de que a delinquência era mais alta nos conjuntos
habitacionais em que havia melhorias.
(JACOBS, 2000, p. 123 e 124).
Para ela não existe relação entre boa moradia
e bom comportamento, no que cita a
denominação de Reinhold Niebuhr para isso,
como a “doutrina da salvação pelos tijolos”
(JACOBS, 2000, p. 124). A autora salienta
aspectos que avalia como mais importantes
do que a qualidade das moradias para que um
bairro possa ser considerado bom e útil para
os moradores e para as próprias cidades, tais
como a capacidade de resolver problemas, a
capacidade para autogestão e a qualidade dos
contatos dos habitantes com “[...] grupos políticos,
administrativos e de interesse comum
na cidade como um todo” (JACOBS, 2000,
p. 130). Com este último aspecto marca-se a
importância de inter-relações que ampliam a
vida pública e ao mesmo tempo reduzem a necessidade
de correntes de comunicação longas
(ou mesmo lacunas) e que fazem demandas
das comunidades serem atendidas, gerando o
compromisso da reciprocidade, sob pena de
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não haver ajuda em demandas futuras.
O fato de Jane Jacobs criticar a “doutrina da
salvação pelos tijolos” não quer dizer que não deva
haver preocupação com a qualidade das moradias
por parte do poder público. O alerta da autora está
concentrado no perigo da destruição das relações
existentes entre os moradores de conjuntos habitacionais
consolidados para a realização de projetos
arquitetônicos que não levem em consideração
tais relações e ainda pretendam resolver problemas
complexos como os de segurança.
Neste estudo, concorda-se com Jacqueline
Muniz e Domício Proença Júnior quando afirmam
que “[...] é a orquestração das comunidades
com as polícias e com as agências públicas
que produz ordem”, e também entende-se que
a ordem pública é “[...] uma realidade mais
ampla do que a contenção da desordem e a
investigação, repressão e dissuasão do ilícito”
(MUNIZ; PROENÇA JÚNIOR, 1997, p.
15). No entanto, uma nova noção de ordem
está sendo desenvolvida com a interação dos
diversos atores e agências na elaboração e implementação
de políticas urbanas. Essa noção
deveria se pautar por concepções que garantissem
uma participação equânime e includente,
em que a proteção resultante fosse aproveitada
por todos, e não apenas se reforçasse a participação
por outros canais daqueles que já estão
incluídos ou representados formalmente na
administração dos espaços e dos recursos. A
percepção mais ampla do problema não garante
que o tipo de controle resultante não esteja
eivado dos mesmos vícios do controle formal
sobre a desordem resumida nos ilícitos penais.
No entanto, no Brasil, temos mais frequentemente
um discurso intolerante do que uma
prática verdadeiramente intolerante para com
o crime. Ademais, quando os processos repressivos
funcionam “a todo o gás”, dirigem-se,
como em todo lugar, a alguns grupos de criminosos,
e não a todos2, provocando situações
desconfortáveis para as autoridades quando a
desigualdade é flagrante, ou perpetuando as
consequentes injustiças quando a desigualdade
é sustentável pelos códigos culturais e se estabelece
no âmbito do controle social informal.
Philipe Robert também descreve a passagem
da regulação comunitária à regulação estatal na
segurança, dizendo que esta surge quando aquela
não é mais produtiva, devido à complexidade
das relações sociais. O autor destaca o anonimato3,
que substitui o conhecimento mútuo e
o respectivo potencial de controle. Ele relaciona
o recurso ao Estado (esfera penal) e a “necessidade”
de uma resposta punitiva ao desconhecimento
sobre a autoria dos delitos, sendo este
um ponto de relevo da prática penal que não é
levado em consideração pela teoria. Enquanto
pesquisas apontam a proximidade entre agressor
e vítima em vários tipos de crimes graves
(crimes contra a vida, a integridade física, sexual,
psicológica, etc.)4, que ocorrem inclusive
no ambiente doméstico, também revelam que
o temor é provocado pelo que é estranho, pelo
desconhecido, pelo outro que não tem identidade,
do qual só são esperados prejuízos materiais,
físicos ou de outra natureza.
Anthony Giddens cita Barth para falar sobre
os sentimentos de identidade de grupo,
e diz que em todos os tempos e em todos os
lugares eles são excludentes, ou seja, a forma
como um grupo ou comunidade é concebido
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depende das características atribuídas aos outros,
aos estrangeiros. O autor menciona inclusive
culturas tribais nas quais a palavra que
significa membro da comunidade é a mesma
usada para humano. Assim também surge a associação
de estrangeiro com a designação “bárbaro”
(GIDDENS, 2001, p. 141).
A visão do outro como perigoso pode ser associada,
então, à velha e contestável distinção entre
casa e rua, já explorada na teoria social brasileira
(COIMBRA, 1998) e que envolve uma separação
percebida como problemática por Philippe
Robert, entre as categorias público e privado (ROBERT,
2003). Para o autor, a comunidade cumpre
o papel oposto daquele pretendido pelas políticas
atuais de segurança urbana, ou seja, sua atuação
consiste no encaminhamento de mais denúncias
por parte das organizações comunitárias. A existência
do controle comunitário ativo implica, em
seu pensamento, a possibilidade de resolver os
conflitos na própria comunidade, sem ter que recorrer
à ação estatal (ROBERT, 2003, p. 57).
No caso brasileiro não é isso que percebemos.
Os problemas não têm sido resolvidos na
comunidade, exceto em casos-limite como os de
linchamento, e há cada vez mais a tendência de
se recorrer à ação estatal ou simplesmente esperar
por ela. O próprio Poder Judiciário monopoliza
as conhecidas alternativas judiciais, como
a mediação e a conciliação, e o Poder Executivo,
no comando das polícias, não dá verdadeiras
condições de articulação destas a outros serviços
públicos, aproximando a comunidade a uma
perspectiva participativa nas condições de segurança
efetivas e também no planejamento de
ações voltadas a uma ideia futura de segurança.
As organizações sociais e os movimentos da sociedade
civil são mal vistos e suas lideranças em
geral são consideradas perigosas.
Em 16 de dezembro de 2013, o Ministério
da Defesa – Estado Maior Conjunto das
Forças Armadas editou a Portaria Normativa
nº 3.461, em que dispõe sobre a “garantia da
Lei e da Ordem”. Entre definições de atuação
para todas as forças em caso de ocorrência da
hipótese do art. 142 da Constituição de 1988,
o documento também define quem são, no regime
democrático, as “forças oponentes”:
São segmentos autônomos ou infiltrados em
movimentos sociais, entidades, instituições,
e/ou organizações não governamentais que
poderão comprometer a ordem pública ou
até mesmo a ordem interna do País, utilizando
procedimentos ilegais. 5. PÚBLICOS
ALVO 5.1. Integrantes de movimentos contestatórios
[...] 5.3. Integrantes de organizações
criminosas. 1) Características a) divididos
em facções criminosas; [...].
O debate em torno da Portaria do Ministério
da Defesa se insere no contexto atual das
manifestações populares frequentes no Brasil.
Soma-se a isso a realização de eventos internacionais
no País que despertam a atenção dos
órgãos de segurança pública e das autoridades.
A edição do documento normativo recoloca
em pauta o uso de conceitos vagos e indeterminados
no direito, como o da ordem
pública, sempre aptos a justificar o discurso
jurídico penal e a ação política repressiva por
parte das autoridades.
Importante notar que o uso do conceito da
ordem pública transcende o próprio art. 312
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do Código de Processo Penal (CPP) de 1941,
estando perfeitamente, como se vê, incorporado
nas ações de segurança pública como fundamento
discursivo racional da intervenção
estatal em situações de crise em pleno Estado
Democrático de Direito.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente texto exibiu um panorama do
uso do conceito de ordem pública como elemento
discursivo que orienta a prestação jurisdicional
no Supremo Tribunal Federal nos casos
de prisão preventiva e a apropriação que dele
tem sido feita no âmbito da segurança públicas
das últimas décadas. Estes dois aspectos se relacionam
intrinsecamente, dado que, ao servir
de fundamento para justificar o encarceramento
provisório, termina por orientar uma política
pública de segurança que privilegia a segregação
e criminalização de determinados grupos sociais
(como no caso da Portaria do Ministério da
Defesa). Assim, caracteriza-se uma via de mão
dupla, na medida em que o procedimento judicial
irradia para a política de segurança pública,
dado que a ação de encarceramento fundada na
seletividade de grupos mal vistos socialmente
termina por orientar e reforçar tais estigmas na
política de segurança adotada. Uma legitima e
serve de base para a outra.
Atualmente vê-se o desenrolar de outro capítulo
desse reforço de estereótipos e estigmas
negativos, construídos nos últimos anos na política
e na comunicação social brasileira, no debate
que está acontecendo no Congresso Nacional
em torno da definição legal de terrorismo. O
último lance dessa disputa no plano legislativo
ocorreu em 28 de outubro de 2015, com a retirada
no Senado Federal de um trecho, anteriormente
aprovado na Câmara, que excluía da
aplicabilidade do novo tipo penal às manifestações
políticas, aos movimentos sociais, sindicais
e religiosos que tivessem o objetivo de defender
liberdades, direitos e garantias constitucionais.
Não se sabe qual será o desfecho da tramitação
desse projeto de lei (2016/2015), mas nota-se
que o cerco se fecha em torno da radicalização
da resposta punitiva a situações de inconformidade
com um sistema no qual as condições de
respeito à lei são acessíveis a poucos e desrespeitadas
pelos próprios formuladores das leis e das
políticas públicas. A noção de ordem pública,
sem dúvida, permanece central e desconectada
dos interesses da população.
80. Inquérito policial (Art. 12, CPP): Na maioria dos casos, acompanha a denúncia ou queixa para fins de investigação. É um procedimento administrativo formal e escrito, nele não há contraditório, mas contraditório diferido.
80.1. Estatuto da primeira infância: Alterou o CPP no art. 6 e 318. Apenas serão beneficiados os presos após a lei. A autoridade policial deve especificar no inquérito se a pessoa tem filhos de até 12 anos de idade ou com deficiência para que haja prisão domiciliar em caso de preventiva.
80.2. 25% dos inquéritos iniciam-se por procedimentos de investigação criminal conduzidos pelo MP. 5% são iniciados por outras formas como a receita federal, agencias reguladoras, entre outras.
80.3. Contraditório diferido: A oitiva das partes só ocorre no processo, não no pré-processo.
80.4. Indiciamento: A AP pode formalizar o fato de que alguém está sendo investigado (indiciado), mas é facultativo. Ninguém tem direito a não ser investigado.
80.5. Prazo de investigação e inquérito: 30 dias com réu solto ou 10 dias com o réu preso. Pela lei de drogas, o inquérito pode durar 90 dias com o réu solto ou 30 com o réu preso.
80.6. O inquérito tramita entre AP e MP e somente será submetido ao juizo em caso de medidas sensíveis (ex: Representação pela prisão do investigado, definitiva ou temporária).
80.7. Se houverem elementos de prova suficientes de outras fontes, o juiz pode abrir mão do inquérito.
80.8. O MP submete-se aos mesmos limites de investigação da polícia, inclusive para questões sensíveis.
81. Teoria geral da prova (Art. 155): O juiz não pode fundamentar exclusivamente o seu convencimento em provas produzidas no inquérito.
82. Oferecimento da ação penal: O inquérito deve ficar apenas na secretaria, à disposição das partes para a consulta, mas não precisa ser juntado pois viola o sistema acusatório.
83. Queixa crime: Ação privada / Denúncia: Ação penal pública.
84. SV 14 e lei 13.245/16: Direito do defensor público ou privado, no interesse do representado, ter amplo acesso aos elementos da prova já juntados a procedimentos de investigação preliminar (nesse caso, excluem-se as interceptações telefônicas).
85. Provas cautelares: São documentadas em autos apartados quando estão em curso (ex: Interceptação telefonica, quebra de sigilo bancário). Ocorre mitigação do direito de defesa pois o inquérito policial é um procedimento administrativo de natureza inquisitória que não tem compromisso com ampla defesa e contraditório.
86. Presença do advogado: É obrigatória quando qualquer pessoa investigada for prestar esclarecimentos perante autoridade policial. O advogado pode produzir provas, pedir diligências, entre outras atitudes pertinentes para a defesa do investigado (procedimento de natureza discricionária).
85. Natureza acusatória do inquérito: Todos os atos produzidos no inquérito são submetidos ao controle judicial. Havendo negativa da autoridade judicial na produção de prova, o advogado pode tentar trancar o inquérito policial ou pedir produção de prova em juízo.
86. Prazo do inquérito: Quando o inquérito ultrapassa o prazo de 10 dias para o réu preso ou 30 dias para o réu solto, a autoridade policial pede autorização judicial para prorrogação do prazo (art. 10) para que se cumpram certas diligências (ex: Chegada dos laudos).
86.1. Justificativa teórica: O processo segue para o juiz após 30 dias para que ele faça o controle judicial dos atos de inquérito e, se necessário, identifique a produção de provas por meios ilícitos.
87. Inquérito é mandado para o MP: Ele pode controlar os atos de instrução quando é titular da ação penal e utilizará as provas para oferecer a denúncia posteriormente. O inquérito também pode iniciar-se pelo MP ou pela autoridade judicial, por requisição do ministro da Juistiça ou pelo ofendido em crimes de APPuC ou APPr.
88. Publicidade: Em regra, inquéritos não são públicos para a proteção da identidade da pessoa.
89. Controle judicial dos atos de inquérito: Existe um controle em tese, mas os juizes dão maior atenção aos elementos produzidos em sede de inquérito policial quando o inquérito for relatado.
90. Forma e prazo:
90.1. Forma (art. 9): Todas as diligências do IP deverão ser realizadas deverão ser realizadas sob forma escrita. É necessária a formalização de todos os atos de inquérito para que a autoridade policial decida se continuará insistindo na realização de determinada diligência (ex: Intimando novamente uma testemunha).
90.2. Prazo: 10 dias para pessoa investigada presa e 30 dias para solta.
90.2.1. Contagem do prazo: Deve-se excluir o primeiro dia da contágem do prazo e considerar o último.
91. Formas de instauração do IP:
91.1. Ação penal pública incondicionada (APPI): B.O, APF, registro no Disque denúncia.
91.2. Verificação prévia de informação: Checar se a denúncia é verdadeira ou trote (materialidade ou nexo de causalidade).
91.3. Portaria: Instauração assinada pela autoridade policial (delegado). Nesta, a autoridade policial define todas as diligências do curso do inquérito (art. 6º). Dependendo da natureza do crime, nem todas as diligências precisarão ser feitas, mas todas precisam ser assinadas pela autoridade policial. Na portaria, o prazo já é definido. Se ele se esgotar, a propria autoridade policial vai requerer a prorrogação a autoridade judiciária.
92. Inquérito no Judiciário: Torna-se um processo e é distribuido entre as varas criminais competentes onde receberá um número de registro, informando data, instância e UF.
93. Juiz: Estará responsável por todos os atos do inquérito e oferecimento da denúncia.
94. Relatório: Após cumpridas as diligências, é o último ato da autoridade policial no IP. O delegado relata todas as diligências realizadas e não realizadas. Entregue pela polícia ao MP para que este decida se existe materialidade e indícios suficiêntes de autoria e justa causa para que se possa apresentar uma denúncia e uma acusação formal.
95. Após concluído o inquérito: A ação penal segue para o MP. Propõe-se no MP a APP e tem-se o controle judicial dos atos de inquérito (Ex: Desconsiderar provas produzidas por meios ilícitos). O MP busca indícios de autoria, materialidade e justa causa para a propositura da APP.
95.1. Diligências incompletas no IP: O MP pode pedir devolução a autoridade policial, indicando quais diligências precisam ser refeitas após passar pela avaliação (ex: Testemunha fundamental não ouvida).
96. Arquivamento: Responsabilidade do juiz, que pode acolher ou insurgir-se. Autoridades policiais e membros do MP não podem arquivar o inquérito, só o juiz pois este é o destinatário da prova. O arquivamento só ocorrerá quando o MP reconhecer que não há indícios de autoria, materialidade ou justa causa, sendo assim o arquivamento precisa ser fundamentado. 96.1. Recurso: Não cabe após a decisão de arquivamento.
96.1. Arquivamento implícito: Quando o MP decide investigar apenas parte dos suspeitos, ignorando os demais.
96.2. MP pede arquivamento: O juiz pode discordar se identificar indícios de crime (art. 28), porém se mais de um promotor entender que o processo deve ser arquivado, o juiz deve aceitar.
93. Revisão pelo PGR: Em caso do juiz não aceitar fazer o arquivamento (art. 28º) -Insurgimento-.
94. O juiz é o responsável pelo arquivamento (Sum 524, STF): O MP não arquiva, apenas pede o arquivamento, AP não arquiva, apenas faz o relatório, ambos primam pela imparcialidade pois têm função investigativa.
95. Diligências do MP:
95.1. Denúncia: Havendo autoria, materialidade e justa causa;
95.2. Pedido de promoção do arquivamento;
95.3. Pedido de diligências complementares: Quando forem relevantes e necessárias para melhor entendimento, devendo ser endereçado ao juiz e só depois seguirem para o delegado.
95.4. Vinculação do indiciamento: Nem sempre haverá para fins de investigação pois o MP, no momento da denúncia, não estará ligado a tipificação inicial.
95.5. Fundamentação: O MP não precisa fundamentar alguma mudança na denúncia pois o investigado só deve se defender dos atos e não da tipificação. Não precisa de investigação preliminar para oferecer a denúncia e nem se submete a captulação dada pela AP.
96. Arquivamento implícito: A não menção de todas as pessoas investigadas no IP pode anular o processo.
97. Antecedentes e reincidência:
97.1. Antecedentes: Para a diminuição ou aumento da pena.
97.2. Reincidência: Ter sentença penal condenatória transitada em julgado ou quando há uma decisão condenatória por órgão colegiado em execução provisória de pena (importante para a prisão preventiva e condenação).
98. Prazos:
98.1. IP em caso de pessoa presa: 10 dias.
98.2. Oferecimento de denúncia pelo MP: 5 dias.
98.3. Resposta da acusação: 15 dias.
98.4. Designação da audiência de interrogatório: 5 dias.
99. Proporcionalidade e razoabilidade: Se o crime é de menor potencial ofensivo, comum, baixa complexidade, com 1 ou 2 réus na ação penal, estima-se a razoável duração do processo (art. 93-A, CF). Não se pode presumir que todos os processos terão o mesmo prazo pela diferença de complexidade entre eles.
100. Juiz concorda com o arquivamento: O inquérito só poderá ser desarquivado quando houverem fatos novos (Sum. 524, STF).
101. Propositura como objeto da investigação: O MP pode fazer procedimento preliminar, não há necessidade de taxatividade na função investigativa. O MP pode conduzir investigações criminais e ações penais.
102. Apuração: A autoridade policial não pode deixar de apurar determinado crime, toda notícia crime merece investigação.
103. Controle externo da atividade policial: O MP é responsável por investigar crimes ligados a policiais (ex: Caso sombra).
104. PEC 37: Foi rotulada como contrária a CF por querer retirar do MP o poder de investigação e entrega-lo a policia.
105. Resolução nº 174/17: Regulamenta o procedimento de investigação produzido pelo MP.
106. Falta de previsão legal expressa dos procedimentos de investigação do MP (Res. nº 174/17): Não há previsão expressa no alcance ou nas possibilidades. As diligências complementares podem ser feitas pelo próprio MP.
107. Inquérito penal (PL. 4373/13): Altera o CPP para mudar o regime de inquérito policial e inserir na legislação processual os poderes de investigação conduzidos pelo MP. O inquérito policial torna-se exclusivo da policia, porém o MP teria as mesmas diligências.
107.1. PROPOSTA DE RESOLUÇÃO CNMP n° …. , de …. de ….. de 2017.
Dispõe sobre instauração e tramitação do procedimento
investigatório criminal a cargo do Ministério Público.
O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, no exercício de suas
atribuições conferidas pelo artigo 130-A, § 2º, da Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988 e com fundamento nos artigos 147 e seguintes do Regimento Interno do Conselho
Nacional do Ministério Público - RICNMP, nos autos da Proposição n° , julgada na … Sessão
Extraordinária, realizada em 2017;
CONSIDERANDO o disposto nos artigos 127, caput, e 129, incisos I, II, VIII e IX, da
Constituição da República Federativa do Brasil, bem como no artigo 8º da Lei Complementar nº
75/1993 (LOMPU) e no artigo 26 da Lei nº 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público);
CONSIDERANDO as conclusões do Procedimento de Estudos e Pesquisas nº 01/2017,
instaurado com o objetivo de levantar sugestões e apresentar de propostas de aperfeiçoamento: a)
para o exercício mais efetivo da função orientadora e fiscalizadora das Corregedorias do
Ministério Público, com o objetivo de aprimorar a investigação criminal presidida pelo
Ministério Público; e b) da Resolução n. 13-CNMP (que disciplina o procedimento investigatório
criminal do Ministério Público), com o objetivo de tornar as investigações mais céleres,
eficientes, desburocratizadas, informadas pelo princípio acusatório e respeitadoras dos direitos
fundamentais do investigado, da vítima e das prerrogativas dos advogados;
CONSIDERANDO que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, fixou, em
repercussão geral, a tese de que o “Ministério Público dispõe de competência para promover, por
autoridade própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados
os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer pessoa sob investigação
1/14
do Estado”. (STF – RE 593727, Relator(a): Min. CÉZAR PELUSO, Relator(a) p/Acórdão: Min.
GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 14/05/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL – Mérito Dje-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015);
CONSIDERANDO que, como bem aponta o Ministro Roberto Barroso, em julgamento
do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, “a Constituição de 1988 fez uma opção
inequívoca pelo sistema acusatório – e não pelo sistema inquisitorial – criando as bases para uma
mudança profunda na condução das investigações criminais e no processamento das ações penais
no Brasil” (Corpo do Acórdão – STF – ADI 5104 MC, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO,
Tribunal Pleno, julgado em 21/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO Dje-213 DIVULG 29-10-
2014 PUBLIC 30-10-2014);
CONSIDERANDO a necessidade de permanente aprimoramento das investigações
criminais levadas a cabo pelo Ministério Público, especialmente na necessidade de modernização
das investigações com o escopo de agilização, efetividade e proteção dos direitos fundamentais
dos investigados, das vítimas e das prerrogativas dos advogados, superando um paradigma de
investigação cartorial, burocratizada, centralizada e sigilosa;
CONSIDERANDO a carga desumana de processos que se acumulam nas Varas
Criminais do país e que tanto desperdício de recursos, prejuízo e atraso causam no oferecimento
de Justiça às pessoas, de alguma forma, envolvidas em fatos criminais;
CONSIDERANDO, por fim, a exigência de soluções alternativas no Processo Penal
que proporcionem celeridade na resolução dos casos menos graves, priorização dos recursos
financeiros e humanos do Ministério Público e do Poder Judiciário para processamento e
julgamento dos casos mais graves e minoração dos efeitos deletérios de uma sentença penal
condenatória aos acusados em geral, que teriam mais uma chance de evitar uma condenação
judicial, reduzindo os efeitos sociais prejudiciais da pena e desafogando os estabelecimentos
prisionais.
RESOLVE, nos termos do artigo 130-A, §2º, I, da Constituição Federal, expedir a
seguinte RESOLUÇÃO:
2/14
Capítulo I
DA DEFINIÇÃO E FINALIDADE
Art. 1º O procedimento investigatório criminal é instrumento sumário e
desburocratizado de natureza administrativa e inquisitorial, instaurado e presidido pelo membro
do Ministério Público com atribuição criminal, e terá como finalidade apurar a ocorrência de
infrações penais de natureza pública, servindo como preparação e embasamento para o juízo de
propositura, ou não, da respectiva ação penal.
§ 1º O Membro do Ministério Público deverá promover a investigação de modo efetivo
e expedito, devendo evitar a realização de diligências impertinentes, desnecessárias e
protelatórias, devendo priorizar, sempre que possível, as apurações que importem em violações a
bens jurídicos de alta magnitude, relevância ou com alcance de número elevado de ofendidos.
§ 2º O procedimento investigatório criminal não é condição de procedibilidade ou
pressuposto processual para o ajuizamento de ação penal e não exclui a possibilidade de
formalização de investigação por outros órgãos legitimados da Administração Pública.
Art. 2º Em poder de quaisquer peças de informação, o membro do Ministério Público
poderá:
I – promover a ação penal cabível;
II – instaurar procedimento investigatório criminal;
III – encaminhar as peças para o Juizado Especial Criminal, caso a infração seja de
menor potencial ofensivo;
IV – promover fundamentadamente o respectivo arquivamento;
V – requisitar a instauração de inquérito policial.
Art. 3º O procedimento investigatório criminal poderá ser instaurado de ofício, por
membro do Ministério Público, no âmbito de suas atribuições criminais, ao tomar conhecimento
de infração penal, por qualquer meio, ainda que informal, ou mediante provocação.
§ 1º O procedimento investigatório criminal deverá tramitar, comunicar seus atos e
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transmitir suas peças, preferencialmente, por meio eletrônico.
§ 2º O procedimento deverá ser instaurado sempre que houver determinação do
Procurador-Geral da República, do Procurador-Geral de Justiça ou do Procurador-Geral de
Justiça Militar, diretamente ou por delegação, nos moldes da lei, em caso de discordância da
promoção de arquivamento de peças de informação.
§ 3º A designação a que se refere o § 2º deverá recair sobre membro do Ministério
Público diverso daquele que promoveu o arquivamento.
§ 4º A distribuição de peças de informação deverá observar as regras internas previstas
no sistema de divisão de serviços.
§ 5º No caso de instauração de ofício, o membro do Ministério Público poderá
prosseguir na presidência do procedimento investigatório criminal até a distribuição da denúncia
ou promoção de arquivamento em juízo.
§ 6º O membro do Ministério Público, no exercício de suas atribuições criminais, deverá
dar andamento, no prazo de 30 (trinta) dias a contar de seu recebimento, às representações,
requerimentos, petições e peças de informação que lhes sejam encaminhadas, podendo este prazo
ser prorrogado, fundamentadamente, por até 90 (noventa) dias, nos casos em que sejam
necessárias diligências preliminares para a investigação dos fatos para formar juízo de valor.
Art. 4º O procedimento investigatório criminal será instaurado por portaria
fundamentada, devidamente registrada e autuada, com a indicação dos fatos a serem investigados
e deverá conter, sempre que possível, o nome e a qualificação do autor da representação e a
determinação das diligências iniciais.
Parágrafo único. Se, durante a instrução do procedimento investigatório criminal, for
constatada a necessidade de investigação de outros fatos, o membro do Ministério Público
poderá aditar a portaria inicial ou determinar a extração de peças para instauração de outro
procedimento.
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Art. 5º Da instauração do procedimento investigatório criminal far-se-á comunicação
imediata e, preferencialmente, eletrônica ao Procurador-Geral da República, Procurador-Geral de
Justiça, Procurador-Geral de Justiça Militar ou ao órgão a quem incumbir por delegação, nos
termos da lei.
Capítulo II
DAS INVESTIGAÇÕES CONJUNTAS
Art. 6º O procedimento investigatório criminal poderá ser instaurado de forma conjunta,
por meio de força tarefa ou por grupo de atuação especial composto por membros do Ministério
Público, cabendo sua presidência àquele que o ato de instauração designar.
§ 1º Poderá também ser instaurado procedimento investigatório criminal, por meio de
atuação conjunta entre Ministérios Públicos dos Estados, da União e de outros países.
§ 2º O arquivamento do procedimento investigatório deverá ser objeto de controle e
eventual revisão em cada Ministério Público, cuja apreciação se limitará ao âmbito de atribuição
do respectivo Ministério Público.
Capítulo III
DA INSTRUÇÃO
Art. 7º Sem prejuízo de outras providências inerentes a sua atribuição funcional e
legalmente previstas, o membro do Ministério Público, na condução das investigações, poderá:
I – fazer ou determinar vistorias, inspeções e quaisquer outras diligências, inclusive em
organizações militares;
II – requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades, órgãos e
entidades da Administração Pública direta e indireta, da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios;
III – requisitar informações e documentos de entidades privadas, inclusive de natureza
cadastral;
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IV – notificar testemunhas e vítimas e requisitar sua condução coercitiva, nos casos de
ausência injustificada, ressalvadas as prerrogativas legais;
V – acompanhar buscas e apreensões deferidas pela autoridade judiciária;
VI – acompanhar cumprimento de mandados de prisão preventiva ou temporária
deferidas pela autoridade judiciária;
VII – expedir notificações e intimações necessárias;
VII – realizar oitivas para colheita de informações e esclarecimentos;
IX – ter acesso incondicional a qualquer banco de dados de caráter público ou relativo a
serviço de relevância pública;
X – requisitar auxílio de força policial.
§ 1º Nenhuma autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de função
pública poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem
prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento
que lhe seja fornecido.
§ 2º As respostas às requisições realizadas pelo Ministério Público deverão ser
encaminhadas, sempre que determinado, em meio informatizado e apresentadas em arquivos que
possibilitem a migração de informações para os autos do processo sem redigitação.
§ 3º O prazo mínimo para resposta às requisições do Ministério Público será de 10 (dez)
dias úteis, a contar do recebimento, salvo hipótese justificada de relevância e urgência e em casos
de complementação de informações.
§ 4º Ressalvadas as hipóteses de urgência, as notificações para comparecimento devem
ser efetivadas com antecedência mínima de 48 horas, respeitadas, em qualquer caso, as
prerrogativas legais pertinentes.
§ 5º A notificação deverá mencionar o fato investigado, salvo na hipótese de decretação
de sigilo, e a faculdade do notificado de se fazer acompanhar por advogado.
§ 6º As correspondências, notificações, requisições e intimações do Ministério Público
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quando tiverem como destinatário o Presidente da República, o Vice-Presidente da República,
membro do Congresso Nacional, Ministro do Supremo Tribunal Federal, Ministro de Estado,
Ministro de Tribunal Superior, Ministro do Tribunal de Contas da União ou chefe de missão
diplomática de caráter permanente serão encaminhadas e levadas a efeito pelo Procurador-Geral
da República ou outro órgão do Ministério Público a quem essa atribuição seja delegada.
§ 7º As notificações e requisições previstas neste artigo, quando tiverem como
destinatários o Governador do Estado, os membros do Poder Legislativo e os desembargadores,
serão encaminhadas pelo Procurador-Geral de Justiça ou outro órgão do Ministério Público a
quem essa atribuição seja delegada.
§ 8º As autoridades referidas nos parágrafos 6º e 7º poderão fixar data, hora e local em
que puderem ser ouvidas, se for o caso.
§ 9º O membro do Ministério Público será responsável pelo uso indevido das
informações e documentos que requisitar, inclusive nas hipóteses legais de sigilo e de
documentos assim classificados.
Art. 8º A colheita de informações e depoimentos deverá ser feita preferencialmente de
forma oral, mediante a gravação audiovisual, com o fim de obter maior fidelidade das
informações prestadas.
§ 1º O Membro do Ministério Público poderá requisitar o cumprimento das diligências
de oitiva de testemunhas ou informantes a servidores da instituição, a policiais civis, militares ou
federais, guardas municipais ou a qualquer outro servidor público que tenha como atribuições
fiscalizar atividades, cujos ilícitos possam também caracterizar delito.
§ 2º A requisição referida no parágrafo anterior deverá ser comunicada ao seu
destinatário pelo meio mais expedito possível e a oitiva deverá ser realizada, sempre que
possível, no local em que se encontrar a pessoa a ser ouvida.
§ 3º O funcionário público, no cumprimento das diligências de que trata este artigo,
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após a oitiva da testemunha ou informante, deverá imediatamente elaborar relatório legível,
sucinto e objetivo sobre o teor do depoimento, devendo consignar a data e hora aproximada do
crime, onde ele foi praticado, as suas circunstâncias, quem o praticou e os motivos que o levaram
a praticar, devendo, também, identificar eventuais vítimas e outras testemunhas do fato.
§ 4º O Ministério Público, sempre que possível, deverá fornecer formulário para
preenchimento pelo servidor público dos dados objetivos e sucintos que deverão constar do
relatório.
§ 5º O funcionário público que cumpriu a requisição deverá assinar o relatório e, se
possível, também o deverá fazer a testemunha ou informante.
§ 6º O interrogatório de suspeitos e a oitiva das pessoas referidas nos §§ 6º e 7º do art.
7º, deverão necessariamente ser realizados pelo Membro do Ministério Público.
§ 7º Somente em casos excepcionais e imprescindíveis deverá ser feita a transcrição dos
depoimentos colhidos na fase investigatória.
§ 8º As testemunhas, informantes e suspeitos ouvidos na fase de investigação serão
informados do dever de comunicar ao Ministério Público qualquer mudança de endereço,
telefone ou e-mail.
Art. 9º O autor do fato investigado poderá apresentar, querendo, as informações que
considerar adequadas, inclusive por meio de advogado.
Art. 10. As diligências serão documentadas em auto sucinto e circunstanciado.
Art. 11. As diligências que devam ser realizadas fora dos limites territoriais da unidade
em que se realizar a investigação, deverão ser realizadas por meio de videoconferência e,
somente em casos excepcionais, serão deprecadas ao respectivo órgão do Ministério Público
local.
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§ 1º Nos casos referidos no caput deste artigo, o membro do Ministério Público poderá
optar por realizar diretamente a diligência, com a prévia ciência ao órgão ministerial local, que
deverá tomar as providências necessárias para viabilizar a diligência e colaborar com o
cumprimento dos atos para a sua realização.
§ 2º A deprecação e a ciência referidas neste artigo poderão ser feitas por qualquer meio
hábil de comunicação.
§ 3º O disposto neste artigo não obsta a requisição de informações, documentos,
vistorias, perícias a órgãos ou organizações militares sediados em localidade diversa daquela em
que lotado o membro do Ministério Público.
Art. 12. A pedido da pessoa interessada será fornecida comprovação escrita de
comparecimento.
Art. 13. O procedimento investigatório criminal deverá ser concluído no prazo de 90
(noventa) dias, permitidas, por igual período, prorrogações sucessivas, por decisão fundamentada
do membro do Ministério Público responsável pela sua condução.
§ 1º Cada unidade do Ministério Público, manterá, para conhecimento dos órgãos
superiores, controle atualizado, preferencialmente por meio eletrônico, do andamento de seus
procedimentos investigatórios criminais.
§ 2º O controle referido no parágrafo anterior poderá ter nível de acesso restrito ao
Procurador-Geral da República, Procurador-Geral de Justiça ou Procurador-Geral de Justiça
Militar, mediante justificativa lançada nos autos.
Capítulo IV
DA PUBLICIDADE
Art. 14. Os atos e peças do procedimento investigatório criminal são públicos, nos
termos desta Resolução, salvo disposição legal em contrário ou por razões de interesse público
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ou conveniência da investigação.
Parágrafo único. A publicidade consistirá:
I – na expedição de certidão, mediante requerimento do investigado, da vítima ou seu
representante legal, do Poder Judiciário, do Ministério Público ou de terceiro diretamente
interessado;
II – no deferimento de pedidos de vista ou de extração de cópias, desde que realizados
de forma fundamentada pelas pessoas referidas no inciso I ou a seus advogados ou procuradores
com poderes específicos, ressalvadas as hipóteses de sigilo;
III – na prestação de informações ao público em geral, a critério do presidente do
procedimento investigatório criminal, observados o princípio da presunção de inocência e as
hipóteses legais de sigilo.
Art. 15. O presidente do procedimento investigatório criminal poderá decretar o sigilo
das investigações, no todo ou em parte, por decisão fundamentada, quando a elucidação do fato
ou interesse público exigir; garantida ao investigado a obtenção, por cópia autenticada, de
depoimento que tenha prestado e dos atos de que tenha, pessoalmente, participado.
Paragrafo único. Em caso de pedido da parte interessada para a expedição de certidão a
respeito da existência de procedimentos investigatórios criminais, é vedado fazer constar
qualquer referência ou anotação sobre investigação sigilosa.
Capítulo V
DOS DIREITOS DAS VÍTIMAS
Art. 16. O Membro do Ministério Público que preside o procedimento investigatório
criminal esclarecerá a vítima sobre seus direitos materiais e processuais, devendo tomar todas as
medidas necessárias para a preservação dos seus direitos, a reparação dos eventuais danos por ela
sofridos e a preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem.
§ 1º O membro do Ministério Público velará pela proteção de vítimas e testemunhas que
sofrerem ameaça ou que, de modo concreto, estejam suscetíveis a sofrer intimidação por parte de
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acusados, de parentes deste ou pessoas a seu mando.
§ 2º O membro do Ministério Público que preside o procedimento investigatório
criminal, no curso da investigação ou mesmo após o ajuizamento da ação penal, deverá
providenciar o encaminhamento da vítima ou de testemunhas, caso presentes os pressupostos
legais, para inclusão em Programa de Proteção de Assistência a Vítimas e a Testemunhas
ameaçadas ou em Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados, conforme o
caso.
§ 3º Em caso de medidas de proteção ao investigado, a vítimas e testemunhas, o
membro do Ministério Público observará a tramitação prioritária do feito, bem como
providenciará, se o caso, a oitiva antecipada dessas pessoas ou pedirá a antecipação dessa oitiva
em juízo.
§ 4º O membro do Ministério Público que preside o procedimento investigatório
criminal providenciará o encaminhamento da vítima e outras pessoas atingidas pela prática do
fato criminoso apurado à rede de assistência, para atendimento multidisciplinar, especialmente
nas áreas psicossocial, de assistência jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado.
Capítulo VI
DO ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL
Art. 17. Nos delitos cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, não sendo o
caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor ao investigado acordo de não persecução
penal, desde que este confesse formal e detalhadamente a prática do delito e indique
eventuais provas de seu cometimento, além de cumprir os seguintes requisitos:
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima;
II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, de modo a gerar resultados práticos
equivalentes aos efeitos genéricos da condenação, nos termos e condições estabelecidos pelos
artigos 91 e 92 do Código Penal;
III – comunicar ao Ministério Público eventual mudança de endereço, número de
telefone ou e-mail;
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IV – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à
pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo
Ministério Público.
V – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Código Penal,
a entidade pública ou de interesse social a ser indicada pelo Ministério Público, devendo a
prestação ser destinada preferencialmente àquelas entidades que tenham como função proteger
bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito.
VI – cumprir outra condição estipulada pelo Ministério Público, desde que proporcional
e compatível com a infração penal aparentemente praticada.
§1º Os requisitos estabelecidos pelos incisos I, II e III são obrigatórios, enquanto que as
condições previstas nos incisos IV, V e VI poderão ser estabelecidas isoladas ou
cumulativamente.
§2º Não se admitirá a proposta nos casos em que:
I – for cabível a transação penal, nos termos da lei;
II – o dano causado for superior a dez salários mínimos;
III – o investigado incorra em alguma das hipóteses previstas no art. 76, § 2º, da Lei n.
9.099/95;
IV – o aguardo para o cumprimento do acordo possa acarretar a prescrição da pretensão
punitiva estatal.
§ 3º O acordo será formalizado nos autos, com a qualificação completa do investigado e
estipulará de modo claro as suas condições, eventuais valores a serem restituídos e as datas para
cumprimento e será firmado pelo Membro do Ministério Público, pelo investigado e seu
advogado.
§ 4º A confissão detalhada dos fatos e as tratativas do acordo deverão ser registrados
pelos meios ou recursos de gravação audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das
informações.
§ 5º É dever do investigado comprovar mensalmente o cumprimento das condições,
independentemente de notificação ou aviso prévio, devendo ele, quando for o caso, por iniciativa
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própria, apresentar imediatamente e de forma documentada eventual justificativa para o não
cumprimento do acordo.
§ 6º O acordo de não-persecução poderá ser celebrado na mesma oportunidade da
audiência de custódia.
§ 7º Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo ou não comprovando
o investigado o seu cumprimento, no prazo e condições estabelecidas, o Membro do Ministério
Público deverá, se for o caso, imediatamente oferecer denúncia.
§ 8º O descumprimento do acordo de não-persecução pelo investigado, também, poderá
ser utilizado pelo Membro do Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento
de suspensão condicional do processo.
§ 9º Cumprido integralmente o acordo, o Ministério Público promoverá o arquivamento
da investigação, sendo que esse pronunciamento, desde que esteja em conformidade com as leis
e com esta resolução, vinculará toda a Instituição.
Capítulo VII
DA CONCLUSÃO E DO ARQUIVAMENTO
Art. 18. Se o membro do Ministério Público responsável pelo procedimento
investigatório criminal se convencer da inexistência de fundamento para a propositura de ação
penal pública ou constatar o cumprimento do acordo de não-persecução, nos termos do art. 17,
promoverá o arquivamento dos autos ou das peças de informação, fazendo-o
fundamentadamente.
Parágrafo único. A promoção de arquivamento será apresentada ao juízo competente,
nos moldes do art. 28 do CPP, ou ao órgão superior interno responsável por sua apreciação, nos
termos da legislação vigente.
Art. 19. Se houver notícia da existência de novos elementos de informação, poderá o
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membro do Ministério Público requerer o desarquivamento dos autos, providenciando-se a
comunicação a que se refere o artigo 5º desta Resolução.
Capítulo VIII
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Art. 20. No procedimento investigatório criminal serão observados os direitos e
garantias individuais consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil, aplicando-se,
no que couber, as normas do Código de Processo Penal e a legislação especial pertinente.
Parágrafo único. É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo
aos elementos de informação que, já documentados em procedimento investigatório realizado
pelo Ministério Público, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
Art. 21. Os órgãos do Ministério Público deverão promover a adequação dos
procedimentos de investigação em curso aos termos da presente Resolução, no prazo de 90
(noventa) dias a partir de sua entrada em vigor.
Art. 22. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 23. Fica revogada a Resolução n. 13, de 02 de outubro de 20106, deste Conselho
Nacional do Ministério Público.
108. Procedimento de investigação criminal - PIC (Res. nº 181/17): Não é obrigatório e não anula a propositura da ação penal, se houver.
108.1. Natureza administrativa: O MP quer se desvincular das regras do DPP com o afastamento da oficiosidade do IP, utilizando meios informais de conhecimento.
109. Prazo: Para a conclusão dos procedimentos de investigação:
109.1. Mínimo: 30 dias / Máximo: 90 dias.
110. Instrução (art. 7º): O MP poderá realizar.
111. Denúncia: Após a reportação (que pode ser anônima), é gerada a notícia de fato (NF).
111.1. Noticia de fato de instância diversa (NFID): Registra-se a notícia de fato que será mandada para a PGR para que se pratiquem atos de investigação para que haja verificação da informação. Não há especificidade de diligências utilizadas pois é de natureza administrativa.
111.2. Portaria de instauração: O membro do MP discutirá a instauração do processo. Todas as diligências que serão utilizadas durante o procedimento de investigação devem ser especificadas.
111.3. A ação penal não pode ser fundamentada exclusivamente em uma denúncia anônima, mas pode-se ter como base.
112. Aplicação da SV 14: Se o advogado tiver conhecimento de que tramita um PIC contra seu cliente no MP, poderá comparecer com uma procuração e pedir cópia. Se não houver procuração, o procedimento não será público, mas sigiloso pela lógica inquisitorial.
112.1. Publicidade: Aplicada apenas quando há instauração de ação penal, onde os processos são públicos.
112.2. Sigilo: Bens jurídicos tutelados sensíveis ou se houver pedido de segredo de justiça.
113. Procedimentos de investigação paralelos: A policia e o MP podem realizar processo de investigação concomitantemente e também pode haver participação nas diligências um do outro.
114. Prisão preventiva: O pedido só pode ser feito pelo MP.
115. Investigação preliminar: CPI's e PAD's.
115.1. CPI: Comissões parlamentares de inquérito têm poderes de investigação limitados, intimando pessoas para serem ouvidas na câmara ou senado, porém não tem poder de prisão (só se houver mandado).
115.2. PAD: Conduzido por outras instâncias. Se houver investigação de natureza administrativa, que tenha reflexão criminal, é possível se encaminhar procedimento ao MP para propor ação penal direta.
116. Interceptação: Não pode ocorrer sem autorização do STF.
117. Direito de silêncio: Pode haver habeas corpus ou mandado de segurança preventivo para que não haja auto incriminação e possam permanecer em silêncio.
118. Prisões processuais:
118.1. Natureza provisória;
118.2. Elementos básicos: Cumprida em regime integralmente fechado (sem progressão) nos centros de detenção provisória.
118.3. Separação adequada: Homens, mulheres, trans, cis, adultos e idosos.
118.4. Prazo: Depende do tipo de prisão.
119. Tipos de prisão:
119.1. Preventiva (art. 312, CPP): Não tem prazo.
119.2. Temporária (Lei 7960/89): Tem prazo de 5 dias (prorrogáveis por mais 5) ou 30 dias (prorrogáveis por mais 30 em caso de crimes hediondos). Pode ser pedida no curso do inquérito em caso de ameaça as investigações.
119.3. Domiciliar (art. 318, CPP): Não tem prazo.
119.3.1. Preferencias: Doentes graves e gestantes (art.318).
120. Detração da pena: Conta como desconto por seu regime ter sido inicialmente fechado.
121. Prisão cautelar: Uma prisão provisória por questão de segurança pública. Atende somente ao processo.
121.1. Requisitos: Necessidade e proporcionalidade.
121.1.1. Perigo em mora: A demora da prestação jurisdicional pode trazer um perigo maior.
121.1.2. Indícios de autoria e materialidade: São necessárias provas diversas de que a pessoa praticou os crimes.
121.1.3. Risco a liberdade: A pessoa em liberdade pode colocar algo em risco.
121.1.4. Liberdade como regra e prisão como exceção: A autoridade deve testar todas as medidas cautelares do 317 antes de decretar a prisão, devendo justificar o motivo das cautelares não terem sido suficientes.
122. Medida cautelar: Pode variar entre outras além da prisão (ex: Fiança).
1. Prisão temporária (L. 7960/89): Não há regulamentação no CPP.
1.1. Prazo: 5 dias, com possibilidade de prorrogação por
mais 5 (mediante autorização judicial e pedido
fundamentado);
1.2. Pressupostos da lei: Individualização da pena,
cabimento de prisão em flagrante e investigação
antecipada.
1.3. Crimes hediondos: 30 dias, prorrogáveis por mais 30.
1.4. Finalidade: Realização de investigação criminal.
1.5. Admissão: Apenas em fase de inquérito e não de
ação penal.
2. Prisão preventiva (art. 312): Prisão processual.
2.1. Não há prazo definido: Pode vigorar desde o
flagrante até a sentença penal condenatória, havendo
possibilidade de detração (diminuição) da pena, não
havendo possibilidade de prorrogação.
2.2. Caráter cautelar: Manutenção da instrução criminal
(não punitiva).
2.3. Presos provisórios: Cumprem em regime fechado.
2.4. Finalidade (art. 312, cpp): Periculum libertatis e
fumus comissi delicti, em outras palavras, Garantia da ordem pública (evitar reiteração da prática criminosa ou comoção),
econômica e conveniência da instrução (evitar contato com outros suspeitos) e aplicação da lei
penal (evitar fuga).
2.5. Para crimes dolosos: Apenas acima de 4 anos, não podendo ocorrer para crimes dolosos e imateriais, o crime deve obrigatoriamente ter ocorrido com indícios suficientes de autoria.
2.6. Pode ser declarada de ofício após recebido a denúncia e antes do início da ação penal.
2.7. Só pode ser decretada com o acolhimento de representação do MP ou PM, onde é pedida a prisão preventiva ao juiz.
2.8. Decretação e revogação: Pode ocorrer a qualquer momento quando se fizer necessário. Ter residência fixa e trabalho honesto não é suficiente para a isenção.
3. Prisão domiciliar (art. 317 e 318):
3.1. Prazo: Não há prazo definido.
3.2. Finalidade: Conceder tratamento humanitário.
3.3. Regime semiaberto: Se o Estado não puder oferecer
local adequado, será permitida a prisão domiciliar.
4. Prisão para averiguação: Autoridade policial poderia
conduzir a qualquer momento o suspeito, sem mantado
ou flagrante (regime militar).
5. Medidas cautelares (art. 319, cpp):
5.1. Lei das cautelares (Lei 12.403/11): Incluiu as medidas
cautelares no cpp, estabelecendo 9 MC's e instituindo a
fiança (art. 319).
5.2. Processo penal de natureza acusatória: A liberdade
como regra e a prisão como exceção, criando medidas
cautelares alternativas e anteriores a prisão preventiva.
5.3. Conversão de flagrante em preventiva: Quando
presentes os requisitos do 312 e 313, não
necessariamente a prisão em flagrante será convertida
em preventiva. Antes deve ser analisado se uma ou mais
medidas cautelares são suficientes para manter a
vinculação do preso ao processo.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como
garantia da ordem pública, da ordem econômica, por
conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a
aplicação da lei penal, quando houver prova da
existência do crime e indício suficiente de autoria.
(Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser
decretada em caso de descumprimento de qualquer das
obrigações impostas por força de outras medidas
cautelares (art. 282, § 4o). (Incluído pela Lei nº
12.403, de 2011).
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será
admitida a decretação da prisão preventiva:
(Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de
liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;
(Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em
sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no
inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7
de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação
dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar
contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou
pessoa com deficiência, para garantir a execução das
medidas protetivas de urgência; (Redação dada
pela Lei nº 12.403, de 2011).
IV - (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único. Também será admitida a prisão
preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil
da pessoa ou quando esta não fornecer elementos
suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser
colocado imediatamente em liberdade após a
identificação, salvo se outra hipótese recomendar a
manutenção da medida. (Incluído pela Lei nº
12.403, de 2011).
6. Mini reforma do PP: O poder Executivo encaminhou 10
PL's que foram imediatamente instauradas para realizar
uma reforma completa no cpp (ex: pl 4208/01).
6.1. Tratamento sistemático e estruturado das medidas
cautelares e liberdades provisórias;
6.2. Aumento do rol de medidas cautelares;
6.3. Manutenção da prisão preventiva de forma genérica
para a garantia e instituição do processo;
6.4. Impossibilidade de, antes do trânsito em julgado,
haver prisão que não seja de natureza cautelar;
6.5. Valorização da fiança.
7. Fundamentos da cautelaridade: Prisão cautelar é
aquela que estabelece um vínculo ao processo, sendo
que todas as medidas cautelares do 319 medidas de
vinculação a serem cumpridas para que as pessoas
continuem em liberdade.
7.1. São medidas cautelares diversas da prisão (319):
Havendo descumprimento de algum objetivo da MC,
ocorre prisão preventiva. Esta medida é cumulativa.
7.1.1. Comparecimento em juízo: Frequência decidida
pelo juiz.
7.1.2. Proibição de frequentar locais: Comum em
violência doméstica ou jogos de futebol.
7.1.3. Proibição de contato com determinadas pessoas:
Natureza genérica, podendo ser utilizado em diversos
times.
7.1.4. Proibição de ausentar-se da comarca: Ocorre em
fase de inquérito (com as diligências) ou em fase de
instrução (com o interrogatório). A investigação deve
permanecer no local até o término da instrução.
7.1.5. Recolhimento domiciliar noturno: Quando o crime
tem relação com algum ambiente noturno (ex: Festas). A
fiscalização pertence a polícia com horários específicos
(confere).
7.1.6. Suspensão do exercício de função pública: Quando
o crime praticado está relacionado com o exercício de
alguma função pública, utilizando-se do cargo para a
prática do crime.
7.1.7. Internação provisória: Crimes de violência ou grave
ameaça (internação compulsória) como medida cautelar
para inimputáveis ou antecipação da pena.
7.1.8. Monitoração eletrônica: Comum em crimes
sexuais, trata-se de regime aberto ou semi aberto. No
Brasil, começou com os condenados por violência
doméstica. O Estado não provê meios para a devolução
dos aparelhos e pune quem não os devolve a tempo.
7.1.9. Fiança: Deve manter a pessoa vinculada ao
processo por sua natureza cautelar. Se for inocentada, o
dinheiro é devolvido.
7.1.9.1. Quem pode conceder (321): Autoridade policial
(crimes de pena inferior a 4 anos) e Autoridade judiciária
(crimes superiores a 4 anos).
7.1.9.2. Critérios: Salário do réu, tipo de crime e valor do
bem (dependendo da condição financeira do réu, pode
ser aumentada em até 1000x).
7.2. Liberdade provisória: Mecanismo estatal para que não necessite recorrer a prisão, após todas as medidas cabíveis. Se a pessoa descumpre uma das medidas, ocorrerá prisão preventiva.
8. Fiança (art. 321, cpp):
8.1. Autoridade policial (322): Só pode ser concedida
para crimes com pena privativa de liberdade inferior a 4
anos.
8.2. Juiz: Poderá conceder para crimes com pena maior
que 4 anos ou, na impossibilidade da autoridade
judiciária ou policial ou, rever a decisão da AP em 48
horas.
8.3. Crimes inafiançáveis (323): Racismo, tortura, tráfico
de entorpecentes, terrorismo, crimes hediondos e
cometidos por grupos armados.
8.3. Descumprimento (art. 324): Não será concedida a
fiança se for quebrada fiança anterior ou se forem
infringidos os arts. 327 e 328.
Art. 327. A fiança tomada por termo obrigará o
afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as
vezes que for intimado para atos do inquérito e da
instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu
não comparecer, a fiança será havida como quebrada.
Art. 328. O réu afiançado não poderá, sob pena de
quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia
permissão da autoridade processante, ou ausentar-se
por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem
comunicar àquela autoridade o lugar onde será
encontrado.
8.4. Limites de valor: Caso a pessoa presa não tenha
condições econômicas de pagar a fiança, não poderá ser
punida por meio de prisão preventiva. Sendo assim, o
juiz deve renovar a fiança e aplicar outras cautelares (IV).
8.4.1. De 1 a 100 salários mínimos.
8.5. Penas privativas de liberdade menores que 4 anos.
8.6. Proporcionalidade: Situação econômica do preso e
valor do bem.
8.7. Indenização (art. 387, IV): A fiança não serve para
indenização da vítima.
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: IV -
fixará valor mínimo para reparação dos danos causados
pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo
ofendido;
8.8 Quebra da fiança (art. 341): Não comparecimento o
réu já quebra pois a finalidade da fiança é manter o
vínculo da pessoa processada.
8.9. Requisitos para a fiança (art. 326):
Art. 326. Para determinar o valor da fiança, a autoridade
terá em consideração a natureza da infração, as
condições pessoais de fortuna e vida pregressa do
acusado, as circunstâncias indicativas de sua
periculosidade, bem como a importância provável das
custas do processo, até final julgamento.
8.10. Mudança ou ausência da residência (art. 330): Para
possíveis intimações, se a viagem ultrapassar 8 dias, deve
ser avisado (ex: Via whatsapp);
8.11. Emissão do boleto: Deve ser emitido e pago no
mesmo dia. Uma vez pago o boleto, a pessoa poderá
responder em liberdade até o final do processo desde
que não hajam hipóteses de descumprimento.
8.12. Formas de pagamento (art. 330): Dinheiro, pedras,
objetos e metais preciosos, títulos ou hipotecas. Poderão
ser usados para o pagamento das custas se o réu for
condenado.
8.11. Reforço da fiança (art. 340): Quando o valor inicial
não for suficiente. Se ela não for cumprida, caracteriza-se
o descumprimento.
9. Ação penal (Art. 5º, XXXV, CF):
9.1. Ação: Direito público, subjetivo, autônomo, que tem
como finalidade a formação da lide (pretensão resistida).
9.2. Art. 41, cpp: Exp. do fato (indicação de autoria e
materialidade), Tipificação penal (classificação do crime)
e rol de testemunhas.
10. Estado X Indivíduo ou Indivíduo X Indivíduo:
10.1. APPu Incondicionada: Quando o crime não
menciona o tipo de ação penal e a tutela do bem jurídico
é de interesse do Estado (bens de grande repercussão).
10.2. APPr: Termo mediante queixa, com bens jurídicos
individualizados. Ela é subsidiária da ação penal pública,
ocorrendo com a inércia do MP.
10.2.1. Querelante: Sujeito passivo.
10.2.2. Querelado: Sujeito ativo.
11. Condições da ação:
11.1. Legitimidade: Atrelada ao jus puniendi do MP (art.
129, I, CF);
11.2. Possibilidade jurídica do pedido: Em 2 sentidos;
11.2.1. Reunir indícios de autoria e materialidade: Só há
possibilidade jurídica do pedido se apontados na
denúncia os indícios.
11.2.2. Justa causa: Precisa-se de um crime, discussão
sobre imputabilidade do autor, indícios coletados
(Autoria e materialidade) em investigação preliminar (IP
ou procedimento do MP) e base empírica idônea (provas
produzidas por meios lícitos).
11.3. Interesse de agir;
12. Requisitos para a possibilidade jurídica do pedido
(art. 41, CPP): Exposição do fato criminoso em todas as
suas circunstâncias.
13. Ausência de participação da vítima no processo: Não
há no PP interesse em dirimir conflitos.
14. Princípios da APPu:
14.1. Legitimação: Pertence ao MP (art. 129, CF).
14.2. Princípio da obrigatoriedade (art. 24): Havendo
autoria, materialidade e justa causa, o MP é obrigado a
propor ação penal.
14.3. Princípio da indisponibilidade: O MP não pode
desistir da ação, tanto para condenar quanto para
absolver, e deve especificar se o indivíduo é culpado ou
inocente.
14.4. Princípio da paridade de armas: O Estado tem todos
os meios para investigar o indivíduo, ocorrendo uma
relação desigual. Sendo assim, os mecanismos
principiológicos devem favorecer o indivíduo.
14.4.1. Exceções: Suspensão condicional do processo.
14.4.2. Prazo: 2 anos, onde a pessoa cumpre
determinadas condições, passando este prazo, ocorre a
sentença extintiva de punibilidade.
14.5. Princípio da indivisibilidade: Na IP que investiga
mais de um indivíduo, se estão presentes os requisitos, o
MP oferece ação penal contra todos, aplicando APPu ou
APPr.
14.5.1. Arquivamento implícito: O MP oferece denúncia
contra apenas um dos réus mas deve manifestar-se
contra os demais e dizer se há ou não requisitos
(AuMaJuCa) ou prosseguir com as investigações.
14.6. Princípio da intranscendência: APP não é transferida
aos herdeiros (pena individual).
14.6.1. Morte: Toda resposta penal se encerra à partir
dela (ex: Prisão, multa).
15. Circunstâncias em que o MP será provocado: Por
meio da investigação preliminar, produzida pelo IP, por
ele próprio ou se qualquer outro órgão administrativo
der conhecimento ao MP de crime de APPu
incondicionada.
15.1. Exceções: Transação penal, suspeição condicional
e colaboração premiada.
15.1.1. Transação penal: Ocorre em crimes de menor
potencial ofensivo, quando o MP encontra os indícios
(Autoria, materialidade e justa causa - AuMaJuCa). Em
razão da economia processual, o MP pode deixar de
oferecer denúncia (ex: pagamento de indenização ou
cestas básicas).
15.1.2. Suspensão condicional: Após a ação penal,
quando o processo já está em curso, mas o juiz entende
que, por condições específicas do réu, cumprindo
determinadas condições, ele não praticará mais crimes.
15.1.3. Colaboração premiada: A denúncia não será
oferecida desde que o colaborador não seja líder da
organização criminosa e suas declarações não sejam
irrelevantes.
16. Princípios constitucionais do PP: Publicidade, Ampla
defesa, contraditório, devido processo legal, duplo grau
de jurisdição, Juiz natural, entre outros.
17. Regras:
17.1. Fase pré-processual: Sigilo.
17.2. Fase processual: Publicidade.
17.3. Segredo de justiça: Apenas para bem jurídico
tutelado de natureza sensível.
18. Inexistência de custas: Todos os atos são gratuitos em
matéria penal por causa da natureza pública.
18.1. Possibilidade de reparação (Art. 387, IV): Fixação de
custas quando há interesse consolidado da vítima (ex:
Crimes patrimoniais).
19. Emenda à denúncia: Identificação de pessoas que
ainda não foram investigadas.
20. Representação: Ato de manifestação da vontade da
vítima ou de seu representante legal para que haja
promoção de investigação criminal ou ação penal (art.
39);
20.1. Forma: Não há forma definida. Pode ser oral ou
escrita, sendo reduzida à termo se for indicada à
produção da prova.
21. Crimes de APPu Condicionada à representação:
Contra dignidade sexual, honra ou funcionário público.
Realizado mediante representação ou requisição.
21.1. Prazo para realização da representação: 6 meses
(prazo decadencial).
21.2. Contagem do prazo: Pela data do fato ou
conhecimento da autoria.
21.3. Suspensão: Pode ocorrer suspensão da ação civil
para que se receba as provas da ação penal, pois estas
serão importantes para o decorrer da ação. Porém, não
há nenhum elemento que a determine.
21.4. Ausência de autoria: Normalmente é identificada
na formulação da denúncia. Quando há uma denúncia
oferecida, é difícil ocorrer absolvição por ausência de
autoria, podendo ocorrer por ausência de provas.
22. Sujeitos processuais: Todas as pessoas que
participam de um processo.
22.1. Tipos: Primários e secundários;
22.1.1. Primários: Têm poder de iniciativa, participando
diretamente do processo com poder de decisão (ex: Juiz).
22.1.2. Secundários: Não precisam necessariamente
participar do processo pois participam de forma indireta
em determinada fase do processo (ex: Perito).
23. Juiz (art. 251): Destinatário do processo e das provas.
23.1. Funções:
23.1.1. Primária: Julgar e participar dos atos processuais
(jurisdicional);
23.1.2. Secundária: Administrativa (ex: Requerer força
policial);
23.2. Causas de impedimento (art. 252): Exercício de
determinadas funções e questões de parentesco (ex:
Sogro ou padrasto -art. 255-). O próprio deve declarar-se
impedido.
23.3. Causas de suspeição (art. 254): Questões de
proximidade, amizade ou inimizade capital. Ambos
exigem elementos de prova.
23.4. Aconselhamento: É necessária prova que pode
caracterizar favorecimento ou advocacia administrativa
(ex: Colhidas por interceptação).
24. MP: Todas as causas de impedimento e suspeição
também se aplicam a ele.
25. Defensor: Nenhum acusado poderá ser julgado sem
ele. Não haverá revelia pela necessidade da presença de
réu, pode haver processo sem réu mas não sem
defensor.
25.1. Funções (art. 265):
25.1.1. Motivo imperioso: Grande dissociação de
matérias de defesa entre réu e defensor.
25.1.2. Motivo ético: Deve-se notificar o cliente e juntar
esta notificação de saída aos autos para que o acusado
não fique desprotegido.
26. Assistente de acusação: Para tutela de interesses
individuais;
26.1. Funções: Trabalhar com o MP na produção de
provas mais completas, promovendo também a APPr
subsidiária pública.
26.2. Morosidade do MP: A assistente pode promover a
APPr no lugar do MP (legitimidade extraordinária). O juiz
se manifesta pela ratificação da denúncia ou
arquivamento.
27. Funcionários da justiça: Servidores, analistas, oficiais
de justiça, técnicos, entre outros que movimentam o
processo.
28. Peritos e interpretes:
28.1. Peritos: São da confiança do juízo, nomeados pelo
juiz à partir de um processo de seleção.
28.2. Interpretes: Equiparados aos peritos, também são
de confiança do juiz, disponíveis em caso de necessidade.
29. Jurisdição e competência:
29.1. Jurisdição: Órgão territorial competente para dizer
o Direito.
29.1.1. Funções da Jurisdição:
29.1.1.1. Aplicação da lei penal;
29.1.1.2. Poder: Relacionado a soberania, respeitando as
decisões judiciais.
29.1.1.3. Atividade: Critérios de organização quando há
mais de um representante jurisdicional na região.
29.1.2. Características da Jurisdição:
29.1.2.1. Situação litigiosa concreta: O juiz não fala fora
dos autos nem da lei em tese, ele apenas aplica a lei.
29.1.2.2. Inércia da jurisdição: Movimentação só ocorre
mediante provocação (do MP, na maioria das vezes).
29.1.2.3. Função substitutiva: Substitui o ente privado na
solução do conflito.
29.1.3. Elementos da Jurisdição:
29.1.3.1. Conhecer (Notio/Cognitio): O juiz tem o poder
de conhecer os litígios para admiti-los como processo
(ocorre no recebimento da denúncia);
29.1.3.2. Função conclusiva (judicium): Compor a lide e
aplicar o Direito Material;
29.1.3.3. Convocação (Vocatio): Poder de fazer
comparecer todos os que podem contribuir para o
processo (condução coercitiva);
29.1.3.4. Coerção (Coercio): Possibilidade da prisão de
ofício (inclusive em fase processual);
29.1.3.5. Execução (executio): Cabe ao poder
jurisdicional a execução de sanções (penas privativas de
liberdade, extintivas de direito e multa).
29.1.4. Princípios da jurisdição:
29.1.4.1. Investidura: O órgão jurisdicional é investido de
todas as funções (aplicar a lei, atuar na provocação e
substituir a sociedade na solução de conflitos).
29.1.4.2. Indeclinabilidade: Só se pode mudar a jurisdição
se houverem elementos que a desloquem, previstos em
lei, atendendo ao devido processo legal (DPL) -ex:
Circunstância que liga a jurisdição a outro órgão-.
29.1.4.3. Exceção: Desaforamento (quando não há
possibilidade de imparcialidade do conselho da sentença,
pode ser declinada a jurisdição do juri).
29.1.4.4. Unidade: Não importa quem seja o juiz, mas se
o mesmo está investido no cargo e exercendo função
jurisdicional.
29.1.4.5. Improrrogabilidade: Princípio da aderência. O
juiz só pode exercer função jurisdicional nos limites da
lei.
29.1.4.6. Juiz natural: Ligado ao exercício da jurisdição.
Indica-se um juiz responsável pelas características e
atividades jurisdicionais.
29.1.4.7. Juridicidade: "Nula poena sine juridicio" (não
há pena sem juízo). Precisa-se da aplicação da jurisdição
para que possa haver pena.
29.1.4.8. Duplo grau: As partes têm direito a uma decisão
revisada por um órgão colegiado superior.
29.2. Competência: Medida da jurisdição, elementos da
jurisdição para dividir a competência.
29.2.1. Elementos para a fixação (art. 69):
Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:
I - o lugar da infração:
II - o domicílio ou residência do réu;
III - a natureza da infração;
IV - a distribuição;
V - a conexão ou continência;
VI - a prevenção;
VII - a prerrogativa de função.
29.2.2. Determinação da competência (art. 70):
Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo
lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de
tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato
de execução.
29.2.2.1. Rationae loci (art. 69, I e II): Lugar da
consumação do crime ou em que houve o ultimo ato. Na
APPr pode haver deslocamento de competência para o
domicílio do réu (em razão do lugar).
29.2.2.2. Rationae materie (III): art. 102, 105, 107 e 109
falam da competência em razão da matéria.
Art. 102. Quando a parte contrária reconhecer a
procedência da arguição, poderá ser sustado, a seu
requerimento, o processo principal, até que se julgue o
incidente da suspeição.
Art. 105. As partes poderão também arguir de suspeitos
os peritos, os intérpretes e os serventuários ou
funcionários de justiça, decidindo o juiz de plano e sem
recurso, à vista da matéria alegada e prova imediata.
Art. 107. Não se poderá opor suspeição às autoridades
policiais nos atos do inquérito, mas deverão elas
declarar-se suspeitas, quando ocorrer motivo legal.
Art. 109. Se em qualquer fase do processo o juiz
reconhecer motivo que o torne incompetente, declará-
lo-á nos autos, haja ou não alegação da parte,
prosseguindo-se na forma do artigo anterior.
29.2.2.3. Rationae personae (VII) Em razão da pessoa e
do cargo que ocupa (ex: prerrogativa de foro) -L.
8038/90-.
29.2.2.3.1. Poder simbólico: Na prerrogativa de foro
existe uma rede relacional de vida ao habito entre o
judiciário que aproxima seus representantes, gerando
poder simbólico (ADI 2797), sendo só para crimes
relacionados a função.
29.3. Critérios de organização relacionados a
competência (art. 69): Fixação e distribuição.
I - o lugar da infração:
II - o domicílio ou residência do réu;
III - a natureza da infração;
IV - a distribuição (Distribuir para as varas competentes);
V - a conexão ou continência;
VI - a prevenção;
VII - a prerrogativa de função.
29.4. Perguntas fundamentais:
29.4.1. Onde? - Denúncia na delegacia mais próxima do
local do crime ou varas federais.
29.4.2. O que? - Natureza do crime.
29.4.3. Quem? - Se há ou não prerrogativa de foro.
30. Teoria geral da prova: Verdade real x verdade
processual:
30.1. Sistema processual de natureza inquisitória: Há
aplicação do princípio da verdade real, reproduzindo-se
fatos como realmente aconteceram.
30.2. Sistema processual de natureza acusatória:
Limitações constitucionais a produção da prova que
geram verdade processual.
30.3. Prioridades: Existem provas como a necropsia que
precisam ser produzidas de imediato pois se perdem com
facilidade.
31. Objeto da prova (thema probandum): Fato a ser
provado.
31.1. MP: Dever de propor a APPu para produzir provas.
31.2. Defesa: A defesa deve provar o não cometimento
do crime através de testemunhas, documentos, entre
outros.
31.3. Fonte da prova: Tudo o que possa comprovar o
fato.
31.4. O que é prova?: Apenas aquelas admissíveis em
direito.
32. Tipos de provas: Ilegítimas, ilegais e ilícitas.
32.1. Ilegítimas: Não são admissíveis em nenhuma
possibilidade pois ultrapassam a vontade e a consciência
da pessoa. A violação corporal não é permitida (ex:
tortura).
32.2. Ilegais: Não estão previstas na legislação, mesmo
que não sejam corporais.
32.3. Ilícitas: Previstas em lei, mas produzidas por meios
ilícitos (ex: interceptação telefônica).
32.3.1. Interceptações telefônicas: Duram no máximo 15
dias, podendo ser prorrogadas por, no máximo, mais 15
(podendo aumentar ainda mais à partir de decisões
fundamentadas.
32.3.2. Grampo: Interceptação sem autorização judicial
ou justificativa.
33. Meios de prova: Documental, pessoal e material.
33.1. Documental: Qualquer prova realizada por escrito
(ex: Documento judicial e extrajudicial).
33.2. Pessoal: Produzida de forma oral (podendo ser
reduzida à termo) -ex: Testemunhal e interrogatório-.
33.3. Material: Acontece quando há exames de materiais
e objetos (ex: mostra no tribunal do juri). Submetida a
um laudo pericial que será juntado ao processo.
34. Hierarquia: No sistema acusatório não há hierarquia
entre provas, porém algumas são mais relevantes
segundo a jurisprudência (ex: palavra da vítima no crime
de estupro).
35. Prova emprestada: Possível em qualquer processo;
35.1. Procedimento de produção de prova: Proposição,
admissão, produção e valoração.
35.1.1. Proposição (primeira fase): Existem momentos
processuais adequados para propor a produção da prova
(ex: denúncia deve ser acompanhada do rol de
testemunhas). As testemunhas do juízo, citadas por
outras testemunhas e arroladas pelo juiz, não serão
ouvidas na condição de testemunhas da acusação.
35.1.2. Admissão: Livre convencimento motivado do juiz
sem precisar discutir o mérito da qualidade da prova.
Cabe ao juiz, no início da fase de instrução, após a
denúncia e resposta à acusação, quando todos os meios
de prova são informados pela acusação e defesa, dizer
quais provas serão deferidas e indeferidas.
35.1.3. Produção: Cabe às partes à partir do fato
investigado ou do fato que se quer provar em resposta
ao fato investigado (ex: Audiência de instrução e
julgamento).
36. Valoração da prova (art. 155, 156 e 157, cpp)
36.1. Livre apreciação: Livre convencimento motivado
com a teoria de persuasão racional, faz com que o juiz
possa escolher as provas produzidas no processo que
fundamentarão a decisão judicial. Dependendo do objeto
do crime ou bem jurídico tutelado, o juiz define quais
provas serão mais relevantes. O juiz aplica a valoração,
limitando-se às provas que puderam ser produzidas.
36.2. Após recebimento da denúncia;
36.3. Provas produzidas no curso do IP ou pelo MP: Não
podem ser a únicas a motivar a sentença penal, por isso
algumas provas devem ser produzidas na ação penal.
36.4. Provas produzidas antes da ação penal: Podem
fundamentar exclusivamente uma sentença penal
condenatória (ex: fase de inquérito, autos de prisão em
flagrante, necropsia), ressalvadas as provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas.
37. Tipos de provas antecipadas: Se não houverem
provas nos termos citados, todas devem ser produzidas
no curso da ação penal.
37.1. Testemunhal: As que podem morrer antes que
acabe o processo.
38. Elementos excluídos na apreciação de provas:
Informativos produzidos exclusivamente na investigação
policial.
39. Provas irrepetíveis: Existem análises que só podem
ser feitas logo após o crime. Às vezes, sem ter instaurado
o inquérito, estas podem ser utilizadas pelo juiz no
âmbito da livre apreciação.
40. Provas cautelares: Podem ser produzidas pois são
submetidas ao crivo judicial (ex: busca e apreensão).
41. Reproduzir provas em fase de ação penal: Para sanar
e não atendimento a ampla defesa e ao contraditório.
41.1. Prova testemunhal (duas vezes): Se a testemunha
não lembrar mais do fato, o juiz poderá usar o que foi
registrado anteriormente para ligar uma prova a outra.
41.2. Prova documental;
41.3. Interrogatório (duas vezes);
42. Confissão: Será anulada se a testemunha foi coagida
(ex: Tortura).
42.1. Laudo: Necessário para comprovar a tortura na
audiência de custódia (ex: Corpo de delito, IML).
43. Ônus da prova (156, cpp): Cabe a quem faz a
alegação.
43.1. Elemento de prova para a defesa: Esta precisa
indicar os meios para alcançar a prova. Se negar um fato,
deve provar que este não ocorreu.
43.2. Juiz produz prova de ofício: Em regra, o juiz é o
destinatário da prova, ele só atuará de ofício para dirimir
dúvidas e pontos relevantes para complementar provas.
44. Tensões sobre a livre valoração de provas: É um
fundamento constitucional pois é excepcional, sendo
utilizada quando o juiz quiser dirimir dúvidas.
45. Meios de prova:
45.1. Provas periciais: Para crimes que deixam vestígios.
45.2. Exame de corpo de delito (158-184, cpp): Quando
há possibilidade de produzir prova pericial (ex: Necropsia
e exame grafotécnico). Um laudo pericial é feito à partir
de um local, objeto ou corpo da pessoa.
45.3. Interrogatório do réu (185-196, cpp): Prova pessoal
e oral, produzida no momento. Esta é a última prova
produzida no processo, sendo dada a oportunidade do
réu se manifestar com relação a todas as provas
produzidas no processo.
45.4. Confissão (197-200; cpp): Pode ser judicial ou
extrajudicial, mas deve ocorrer sem coação. O único
meio não suficiente para a livre apreciação da prova em
nenhum processo criminal, com base no princípio da
verdade processual.
45.5. Declaração do ofendido (art. 208, cpp):
Depoimento de quem foi diretamente afetado pela lesão
ao bem jurídico.
45.6. Testemunhal (202 a 225, cpp): Em regra, toda
pessoa pode ser testemunha.
45.6.1. Escuta qualificada: Para crianças e adolescentes
em um ambiente adaptado, diferente do tribunal, com
pessoas especializadas.
45.6.2. Obstrução de justiça: Não existe tipo penal para
ela, apenas para a desobediência.
45.7. Reconhecimento de pessoas e coisas (226 a 228,
cpp): Reconhecimento feito na delegacia, identificando
as características do agressor pelo retrato falado. Pode
ser repetido na fase judicial quando houverem dúvidas
sobre a autoria do crime.
45.8. Acareação (art. 229 e 230, cpp): Quando o juiz tem
dúvidas quanto às provas produzidas, poderá pedir o
confronto de provas orais (ex: Réu x testemunha,
testemunha x testemunha, vítima x testemunha).
45.9. Prova documental (art. 231 a 238): Não precisa ser
original, qualquer documento pode ser considerado (sem
firma reconhecida, requisitos formais) sendo sempre
usada em parceria com as demais provas do processo.
45.10. Indícios (239): Correlação lógica entre a
participação de determinada pessoa e o seu resultado,
sem prova documental ou material. Somente eles não
são suficientes para a condenação, apenas para o
oferecimento da denúncia.
45.11. Busca e apreensão (art. 240 a 250): Pode ser
domiciliar ou pessoal.
45.11.1. Domiciliar: Só pode ser feita com o mandato
judicial, com exceção dos casos de flagrante.
45.12. Provas ilícitas (art. 157, cpp): São inadmissíveis
por não atenderem aos pressupostos constitucionais e
legais.
45.12.1. Teoria da derivação: São inadmissíveis as
derivadas de provas ilícitas, salvo quando não houver
nexo de causalidade ou quando as derivadas forem
obtidas de fontes independentes.
45.12.2. Meios ilícitos: Inconstitucionais ou ilegais, não
atendendo o previsto na lei (ex: Interceptação telefônica
fora do prazo). Pode ser desconsiderado todo o flagrante
se não houver uma fonte independente para salvar a
prova.
45.13. Serendipidade: Encontro livre ou fortuito de
provas. As obtidas por meios lícitos podem ser utilizadas
na investigação de outros crimes.
46. Prisão civil: Possível apenas para o devedor de alimentos para que ele faça o que for possível para pagar a dívida.
47. Prisão sanção: Não serve apenas como castigo, mas como ressocialização. O sistema brasileiro não permite pena de morte nem prisão perpétua pois estas não ressocializam, mas apenas punem.
48. Prisão administrativa: Não existe mais depois da CF88. Salvo prisões em flagrante, a prisão deve ser escrita por autoridade judiciária competente.
48.1. Direito militar: A única legalizada pelo judiciário. O habeas corpus deve ser impetrado na justiça federal. Tal prisão serve para a manutenção na disciplina.
49. Acesso aos autos: Acesso da defesa nunca ao que está sendo realizado mas ao que já foi.